Friday, 13 January 2012

Laxmanrao Sardessai - A Ave de Rapina (1966)

Goa é um moribundo
E tu és ave de rapina,
Não tenhas medo, amigom
Que os teus defensores armados,
À pouca distancia estão postados
Para prosseguires até o fim
Na tua cela opípara.
Que importa que os filhos da terra
Estejam a fome e na penúria,
Durante dias e meses?
Tu és senhor desta casa
Tu decides... tu executas...
És como antigos sátrapas
Que os imperadores romanos
Enviavam para os domínios conquistados
Para pilharem as terras,
Para semearem terror
Nas populações pacatas.
Está em Bombaim o teu imperador
E os que aqui goveram
São teus lacaios!
Este povo é gado...
Podes espancá-lo impune
Há leis...
Mas tu és o tribunal supremo.
Não há recurso contra tuas decisões.
A tua vontade é lei!
És a última palavra no direito,
Tu podes ofender, maltratar
Cidadãos pacatos
Que não façam bom cabelo aos teus lacaios.
És omnisciente.
Mas nada sabes
Do administrativo e língua
Mas não importa!
Para os efeitos da lei tudo sabes!
Porque representas o imperador.
Tu corres, aqui e acolá.
Da aldeia para aldeia, em inspecção
Que te rende farta ração.
Pessoas do teu meríto,
Há-as aqui, aos milhares
Que podem ser
Teus mestres na administração
Mas acha o teu mestre – lacaio
Que elas são incompetentes!
És um vampiro que sugas
O sangue do contribuintes
Contentas-te com esfolá-lo
Tu vês o dinheiro e nada mais!
Sabes que um dia
Terás de preparar as malas
É, pois, necessário acelarar
O processo de rapinagem
No tempo dos Vice-Reis
Os fidalgos portugueses
Faziam a Índia
Tu e teus irmãos
Hoje fazeis Goa!
Queres a terra
E odeias o povo
Queres a terra
Porque, há nela farto repasto
E odeias o povo...
Porque não fala a tua língua
E não quer afogar-se
No sorvedouro do Maharahstra!
Estás a seguir a politica da perseguição
Perseguir...
Os que não falam o marata
Perseguir – o brâmane e o cristão
Pois, são anti-nacionais!
Só tu és o pai da Pátria
E contigo o teu mentor
Que na verdade é o teu lacaio!

Bicaji Ganecar - Templo (1972)

Quero ver um templo
Onde um cristão
Um hindu e
Um muçulmano
Estejam a rezar,
Perante um e
Único Deus,
O criador,
O omnipotente,
Pelo bem de
Toda a humanidade,
Esquecendo as religiões.

Cyrano Valles - No Meu Jardim (1968)

Há no meu jardim
Flores maravilhosas,
Lindas e rubras rosas
Alvos lírios de cetim…

Há suaves melodias
De pássaros e trinar
E um eco de beijos
Trovados em noites de luar...

Há ainda o rasto
Sobre a relva azul
Da felicidade que passou,
Leve e descuidada,
Como o vento do sul...

Há no meu jardim
Uma saudade sem fim
Da ilusão doirada
Que outrora floriu em mim.

Maria Juliana Cordeiro e Monteiro - Vaidade (1962)

Supor que se é Alguém
Que tudo sabe e tudo diz,
E nas mãos remédio tem
Para a chaga de todo o infeliz.

Sonhar que se paira alto,
Acima da mesquinha terra
E, desperto num sobressalto,
Ser surdo à dor que perto berra,

Julgar que num só verso
Se penetra o fundo da alma,
Se condena a lágrima do Universo
E ao desvairado não dar a calma...

Olhar para o chão com desdém,
Tocar o Céu em acordado,
É loucura do Zé-Ninguém
É vaidade... e mais nada!

Alfredo Bragança - Sonho Desfeito (1963)

Em grandes vagalhões de triste dor,
Arrancando, até, o enorme mar gemia;
Ao longo, majestoso o Sol morria
Numa apoteose de lânguida cor.

Nas praias, todo nós a este sol-pôr,
Quando tudo ao redor era agonia,
Brincávamos, irradiando alegria,
Como lírios difundem o seu olor.

Foi então que escreveste derepente,
Com sorriso magoado e doce pranto,
Na areia branda: eu te amo loucamente.

Mas ai! Que dor! Veio o espumoso manto,
E tudo apagou, só deixando mente
Do teu Poema cheio de doloso encanto.

Sunday, 25 December 2011

Walfrido Antão - Flores Campestres Review (1968)

Alberto Menezes Rodrigues que me honra com sua amizade há anos acaba de me oferecer com uma amável dedicatória seu último livro de contos e que leva o sugestivo título de Flor Campestre. Li-os. Gostei. Tornei a ler e nas suas páginas ainda húmidas do prelo e da imprimissão como diria Jaime Rangel fui encontrar Goa Velha, a antiga capital do Reino dos Kadamba. O ar, o clima dos contos, e telúrico, igual às raízes, ao varzedo verde, à graça fresca e louçã das suas raparigas e mulheres que enfeitam os mercados de Pangim e Margão com o refolho das suas saias de chita e “choli” que revela mais do que esconde.

Quem conhece Goa Velha sabe que esse pequeno rincão da alma goesa tem a genealógica aristocrática de velhos proprietários Menezes, um dos quais deixou pelo seu amor à agricultura um importante tratado sobre a “Arte Palmarica”. Um Plácido Menezes se não me engano que no contexto da nossa economia deixou uma tradição e novos métodos. É assim a terra, a posição geográfica onde se movem os personagens dos contos de Flor Campestre. Alberto Menezes Rodrigues é essencialmente um poeta de sentido lírico como se referiu o crítico literário do jornal O Século de Lisboa ao apreciar seu li

ro de poemas. Rico de imaginação, o autor de Flor Campestre foi buscar ao povo seus personagens. O “conflito” ou seja o “drama” dos contos de Alberto Menezes Rodrigues não tem no entanto a dimensão do “moderno”, “realista”. Falta-lhe a economia das palavras. Vai longe no pormenor e no detalhe. Não deixa ao leitor a margem da “escolha” de ele ser um dos personagens. Como um poeta que é, arranca os personagens à sua fantasia. Vejamos por exemplo o conto “Flor Campestre”. O personagem principal ou o herói é um médico recém formado, que se apaixona por uma Mariana que vinha buscar água ao seu poço. Ela era filha do povo que nunca podia sonhar com um doutor e Alberto Menezes Rodrigues aproveita desta situação para nos dar uma imagem rósea e optimista da vida ‘tout est bien que finit bien”. Depois do “moruoni”, esta passagem “Aproximando-se da noiva ainda mais, e em cujos lábios de rosa, bailava um lindo sorriso de graça e de sonho, e poisando as duas mãos sobre o ombro dela Daniel do Rego depôs na fronte ebúrnea um beijo puríssimo de amor.”

Sejam quais forem as nossas ideias sobre a literatura e muito embora nos custe compremeter o sentido existencial da literatura que papa hóstias de má catadura pouco entendem, convém reconhecer que Alberto Menezes Rodrigues tem contribuído imenso para alargar a dimensão de literatura em Goa. Ele traz influências profundas dos românticos, Júlio Diniz em especial. Até a escolha dos nomes das personagens, como Daniel, parece obedecer a esse comando instintivo. Que Alberto Menezes Rodrigues continue a criar.

Visnum Porobo Sincró - Canavial

Naquele extenso bambual cor de esmeralda
Ocupando o sopé da coluna ondulante
Arequeiras que ficam no fundo do vale
Com toldos de cachos amarelecidos,
Branda aragem murmurando sempre,
Aves trinando encantadores gorgeios,
A cogul anunciadora da Primavera,
De vez em quando soltando sons melífluos,
Os viandantes que se aproximam
Dão graças ao Omnipotente Criador,
Os aborrecidos da faina cotidiana
Esquecem num momento as agruras
No canavial sempre verdejante.