Monday, 25 March 2013

Alberto Cotta - Epistolas 1 (1983)

Sentada ao pé duma janela escancarada à brisa do poente, estava Bena, uma guapa rapariga das suas 18 primaveras o muito. Entretinha-se a bordar um pano de cetim branco esticado na teara colocada sobre os joelhos e encostada ao espaldar duma cadeira à sua frente.

Pertencia a um colégio onde estudava a arte de bordar e talhar, dirigido por uma professora já de idade razoável a quem a experiência adquirida pelo tempo e aliada a uma sólida instrução fazia digna de superintender o estabelecimento que dirigia.

Órfã de pais desde tenra idade, Bena não tivera outro amparo além do irmão e cunhada. Zuleima, sua irmã mais nova que ela também internada do mesmo colégio, era sua fiel companheira. Uma não podia passar sem outra – tão amigas eram.

Bena era a cabeça, Zulema o braço, aquela a pastora esta a ovelha embora de génio arrebatado mas que fácil lhe era voltar ao aprisco, quando desgarrada sob o sisudo bordão da sua pastora. A própria Zulema reconhecia, quando serena, amansada já, o lado benéfico daquele jugo, como ela o qualificava, embora revoltasse no auge de furor. E a tempestade passava desfeita em bonança de arrenpendimento. Deste modo Bena era a Zulema irmã e mãe.

O sol declinava já quase no ocaso, voltavam gralhas ao abrigo e o operariado da lida cotidiana ao remanso do lar.

Súbito Bena deixando o trabalho ergueu-se pressuroso. Tão depressa correu infantilmente pelo jardim fronteiro por entre canteiros de roseiras, jasmina e dálias que crotons multicores ensombravam hospitaleiros.

“Aí vem o mano, ai vem ele!” disse louca de prazer.

E lá está ela ao pé do irmão, individuo alto espadaúdo, bigodes fartos vestido a militar. Chamava-se Francisco da Costa e era oficial do exército em serviço na povoação de X vindo a Pangim por motivo do Estado, motivo que lhe dera ensejo para visitar as irmãs.

“E Zulema?” disse o recém-chegado mas Zulema que o vira vinha já correndo para eles sorridente e ligeiro.

“Pelos modos”, aventurou Bena, cingindo com os braços a cintura proeminente do irmão, pelos modos nem pensa em levar-nos para essa terra de X... e cá estamos há mais de três longos meses sem ver a cunhada e os sobrinhos.

No Maio, minhas prendas no próximo Maio. E que teremos então festa na minha terra de X.

Maio, Junho, Julho, e Setembro!

Outubro, Novembro e Dezembro, rematou Zulema.

A presença da directora interrompeu-lhe a avalancha de meses.

Depôs a conversa decorreu amena para os três irmãos, posto que a directora se retirou após os cumprimentos de estilo. Falaram sobre mil assuntos, choveram mil perguntas as quais o irmão respondeu como podia.

Mas estávamos a falar do Maio, Junho... arriscou Bena voltando-se à carga.

Nada, no Mio próximo, no Maio! Replicou-lhe o tenente que sem esperar por mais correu escada abaixo com risco de se resvalar.

Bena do peitoril da janela repetia alto – No Maio, mano!

E ele virando-se para ela, tornando a girar nos calcanhares, gritou a rir: “No Maio, no Maio!”

Bena imóvel ainda seguio-o com a vista até vê-lo desaparecer atrás da casaria da cidade. Então a expansiva alegria momentânea transformou-se-lhes em amarga nostalgia, principalmente para Bena que não se movera do lugar.

A presença de pombas nos beirais das casa próximas distraiu-a da fixidez do pensamento quedando-se a segui-las no seu caprichoso esvoaçar de telhando em telhado, de muro a muro para de novo pousarem no ponto de partida. Achou divertido aquilo que lhe valeu uma distracção.

Mas como tudo no mundo tende a finalidade e as brancas pombinhas esvoaçaram além eclipsado-se e Bena retirando-se da janela correu ao jardim onde as companheiras de mãos dadas cantavam alegres e descuidosos.

A presença de Bena fê-las hilariante. Choveram epigramas e risotas, e houve uma que saindo do grupo correu ao repuxo de água no centro do jardm para borrifá-las de água importada nos côncavos das mãos. A. A esta seguiram outras e tão depressa o alegre bando molhou-se sob o pesado aguaceiro que o sol agonizante circulou de pérolas.

O movimento excessivo trouxe-lhe a canseira e cada qual acomodou-se em assentos improvisados arquejantes e balofas mas que não impedia de se rirem pela graça que acharam.

Por fim o sol escondeu-se e neblina vespertina toldando o poente anunciou a noite, mas pura, transparente, cintilante de estrelas.

O campanário da Igreja da cidade tangeu ave-marias e o bando recolheu-se à voz da professora do alto da escadaria. Mesmo a subi-la não faltaram ditos alegres e risos reprimidos – bem-aventuradas mocidade sempre viçosa e discuidosa!

Assim no trabalho, no recreio e na própria disciplina encontrava Bena o suave e o belo da vida humana. Era feliz por assim o julgar.

O acordar às cinco da madrugada pura e ridente empregada de perfumes, de estranhos e novos cada dia e inebriantes encantos: trabalho cotidiano com múltiplas variantes, as horas de recreio e mil nadas que adquirem proporções benfazejas para quem sabe compreendê-las, constituíam alegrias perenes para ela que com pouco se contentava, e essa mesma pequenez de desejos fazia-a feliz.

Tal era vida para Bena.

Monday, 18 March 2013

Laxmanrao Sardessai - Ódio (1966)

Invade-me, às vezes, um tédio
Que cresce... cresce...
E se torna ódio.
E então choro... desolado!
Odiar... os irmãos que amo,
A quem sempre desejei
Ventura e calma,
Paz e fama,
E paraíso perfeito.
Mas cresce em mim,
Insensível, gradual... o ódio,
Sentimento que não nutri
Por um inimigo em sonho
E ódio aos irmãos
De sangue e tradição
Ódio aos goeses! Meu Deus!
Porque? Não mo perguntem
Por amor de Deus!
Só lhes digo que sofro
Como uma mãe
Que vê seus filhos queridos
Resvalaram para o abismo
E insensivelmente
Lhes vota ódio.

João Fernandes - Gauddés em Marcha (1973)

Na sua marcha veloz e ascensional, assim como o tempo renova incessantemente, assim também os gaudés de Goa em 21 de Setembro próximo findo, organizaram-se e reivindicaram os seus direitos cívicos e políticos reconhecidos pela Constituição.

Porém, a organização basilar dos seus direitos cívicos e políticos, conforme as sugestões e directrizes por eles indicadas na referida sessão do 21, consistem no seguinte:

Que eles devem ter todos os direitos e regalias quer materiais, intelectuais, espirituais e ainda corporais, numa só união, porque sem esta não pode haver força – porque embora o sábio Legislador indú Manu tenha consagrado nos seus “Institutos” a divisão de sociedade indiana em castas ou classes, estabelecendo para cada uma delas certos preceitos que naqueles nebulosos tempos talvez tivessem a sua razão de ser mas que, hoje não podem nem devem manter-se, porque a instrução e ilustração tem-se penetrado em camadas as mais ínfimas das classe, havendo entre eles Advogados, Médicos, Engenheiros, Professores, Escritores etc., como por exemplo o Dr. Ambedkar, o arquitecto da Constituição.

Que o Governo deve tomar e resolver o assunto por forma a que na futura Assembleia Legislativa eles tenham pelo menos dois assentos ou lugares reservados, como seus representantes e também quanto à instrução tanto o Ensino Primário como Ensino Secundário – gratuitamente porque mesmo que a Instrução Primária seja gratuita não têm eles possibilidades financeiras para mandar os filhos à escola pois há certos a quem ainda falta o pão quotidiano! Nesta parte, ainda eles reclamam insistentemente que devem ficar beneficiados com os subsídios necessários quanto à Instrução Secundária Superior e assistência financeira para o progresso da sua classe.

De resto, não havia necessidade de até fazer as sugestões como se fizeram no referido dia 21, porque automaticamente, impendia ao Governo o dever de fazer cumprir a Constituição sem, distinção de castas, classes e credos.

Porém, sabe-se que a Sub-Comissão do Conselho Informal que estava encarregada do estudo das classes atrasadas, já tinha proposto que a classe dos gaudés, indistintamente da religião, fosse incluída nas classes esqueduladas ao abrigo do Art. 3.32 (XII) da Constituição, e com maioria dos votos, esta sugestão fora apreciada por iniciativas louváveis dos seus membros. E, porque o Governo, pondo de parte todas estas sugestões e apoios tomou numa decisão que os desprotegidos da sorte, Gaudés, fossem afastados das facilidades que lhes confere a Constituição.

Acha quem escreve estas linhas que, se o Governo não tomou medidas adequadas por forma a satisfazer os seus referidos anseios, é porque porque desvirtuou a verdade a verdade por órgãos da informação e isto poderá trazer incalculáveis consequências.

Em média, o número da população dos Gaudés dos Territórios da União de Goa, Damão e Diu oscila entre 50.000 e 60.000 e estes estão dispersos em diversas partes, incluindo sítios montanhosos em busca do seu pão. Se todos estes tivessem residência nos centros urbanos poderiam ter conhecimento do que se passava por este mundo fora, e tendo este conhecimento natural e logicamente teriam imediatamente curiosidade de escolher pelo menos dois membros na Assembleia Legislativa.

A classe dos Gaudés é constituída presentemente de Gaudés Indús, os Gaudés Convertidos e os Gaudés Curumbis, sendo por conseguinte constituído de quatro grupos. Dentre aquelas a dos Gaudés Indús e dos Gaudés Convertidos, a situação é razoável.

Quanto às restantes duas – é ainda pior do que a daqueles a quem nós chamavos rebotalhos ínfimos da sociedade, isto é Harijans, Depressed Classes.

Encarado todo este problema sob o ponto da vista lógico e moral parece-me que por falta de devido apoio e estímulo a classe dos Gaudés revertidos, cada vez está a voltar ao estado de degeneração em vez de o ser para regeneração, porque depois do ano de 1928, e no louvável intuito daquele que o fez converter, ninguém se importou nem trabalhou para levar a efeito o fim desejado e a iniciativa teve em vista!

Não só isto. Mais ainda: a class dos Gaudés, que são chamados o Curumbis infelizmente não foram contemplados e beneficiados dessas regalias, visto estes terem sido considerados no meio social como os Harijans.

Quem escreve estas linhas é um dos da referida classe, com alguma instrução e ilustração e que a bem dos interesses da sua classe trata desta questão em público.

Mécia Elvina de Sousa - Amor da Pátria (1963)

Foi numa noite brumosa e nevoenta, como são geralmente nesta época as noites nas regiões montanhosas do Himalaia.

Num casebre desgarrado, à beira do caminho de ferro, a tiritar de fio junto da lareira, estava o Ramá, um jovem ainda imberbe, velando a cabeceira do pai enfermo que jazia na sua enxerga meio apodrecida, a um cantinho da habitação.

Seria meia-noite, quando muito... Súbito, uma detonação forte reboou pelas quebradas da serra, abalando a pobre cabana desde as fundações.

Ramá salta de repelão do seu cantinho, esgueirando a cabeça pela porta entreaberta e procura inquirir a origem do estranho fenómeno.

Nada enxergando pelo vão da porta, Ramá sai do eirado da casa a ver se descortinava algum vestígio do misterioso abalo. A serração da noite não permitia ver um palmo diante do nariz. A neve inclemente açoitava-lhe o rosto enregelado pelo frio cortante da noite.

Mas agora caíra tudo em silêncio, cortado apenas, de longe em longe, pelo mugido intermitente de uma cascata longínqua a despenhar-se das alturas para o fundo vale de tenebrosas furnas. Seria o sinal de avanço do inimigo que se dizia ter ultrapassado a fronteira? Ou seria acto de sabotagem dos traidores da Pátria, camuflados talvez em vigias do caminho de ferro?

Tinha de apurar a verdade, custasse o que custasse, embora tivesse de jogar nisso a sua vida.

Embrulhando-se na sua capa surrada de pele, um gorro de lã grosseira na cabeça, Rama lá foi seguindo com a sua lâmpada de furta-fogo, a caminho da ponte donde lhe parecia ter partido o infernal estrondo.

O frio gélido da noite penetrava até a medula dos ossos. Era o sopro glacial do Himalaia, a álgida mensagem dos picos de neve perpétuos que se erguiam alterosos de todos os lados. Uma espessa camada de neve cobria o atalho, dificultando a marcha já de si penosa.

Ia-se aproximando agora da terrível cascata, cujo bramido cavo e soturno embravecia de momento a momento com as catadupas da chuva que caía ininterrupta desde o cair da tarde. Uma rajada de vento agreste quase que o ia despenhando, ribanceira abaixo. Equilibrou-se como pode e, lutando conta a fúria dos elementos, lá foi avançando a custo, a tiritar de frio, e eis que, chegado à testa da ponte, vê horrorizado o abismo enorme que se abria a seus pés. A ponte em toda a sua extensão fora destruída por mão criminosa, certamente a soldo do inimigo.

- Deus do Céu! Bradou, num grito lacinante de angústia, a pobre criança, lembrando-se que daí a momentos passaria por lá o comboio a transportar armamento e tropas para a fronteira.

- Que seria dos nossos soldados?

Não havia tempo para hesitações. Corre, voa célere à sua cabana. Dir-se-ia que uma rajada furiosa de vento o impelia pela ladeira íngreme. Cabriolava de rocha em rocha, quase de olhos fechados.

Mais uns saltos apenas e ei-lo no umbral do seu casebre, esbaforido a comprimir o peito com as mãos.

Empuxa com violência a porta que cede ao poderoso impulso de braços nervosos e entra de roldão no recinto onde jazia o pai enfermo que desperta sobressaltado com a algazarra.

Uma voz dentro, desabafa de um fôlego, perante o pai estremunhado do sono, a terrível mensagem que levava.

- Temos que acudir a tempo para evitar a catástrofe – rematou ofegante o jovem.

- Vai, vai depressa, meu filho – gemeu o pai.

E depois com a vez sumida com o sofrimento, acrescentou: está aí no canto do meu baú uma lanterna verde-vermelha dos guardas do caminho de ferro. Vai com ela dar o sinal de alarme à aproximação do comboio... Avança quanto puderes. Quanto mais longe, tanto melhor... já compreendes o resto.

Ramá não quis ouvir mais... Acende a lanterna do pai e salta para a linha férrea, resolvido a enfrentar todos os perigos para salvar a vida dos soldados.

Impelido por uma força oculta, o rapaz parecia ter asas nos pés, na ânsia febril de avançar ao encontro do comboio. Percorria nesse momento a linha férrea no trecho perigoso de uma curva brusca a orlar um precipício medonho. Nem por isso Ramá refreava a sua louca corrida.

Súbito, num dos torcículos do caminho, enxerga o foco intenso da lanterna central da locomotiva, que vinha avançando vertiginosamente para o rapaz.

Postado no meio da linha férrea com mãos convulsas, Ramá agita febrilmente a minúscula lanterna com luz vermelha a dar rebate do perigo iminente.

Ouve-se o chiar agudo dos freios da locomotiva a travar a marcha vertiginosa do comboio. Neste instante o clarão intenso do foco da locomotiva, já próxima, bate em cheio nos olhos de Ramá, que, ofuscado pela luz deslumbrante, salta fora da linha para evitar o embate. Porém, o pulo, formado na precipitação da fuga, foi tão desastrado na precipitação da fuga, foi tão desastrado que o pobre rapaz, desequilibrando-se, deslizou pela beira escorregadia da estreita orla e num instante sumiu-se nas trevas do abismo hiante que se lhe abria aos pés...

No dia seguinte foram encontrar o cadáver do pobre rapaz, reduzido a uma mole informe, no fundo do precipício... Oferecera a sua vida em holocausto pela causa santa da sua querida Pátria.

Alfredo Bragança - Uma Lenda do Ganesh (1962)

Se Lacxmi é a deusa de fortuna e prosperidade, Saraswati é o deus de sabedoria e inteligência, a quem os intelectuais imploram inspiração e auxílio no momento de escrever seus poemas ou prosas, fazendo-os preceder do seguinte tributo de homenagem “Om Shri Ganesha namah” (Reverência a Ganesh). Assim Jayadeva, um dos famosos poetas de Pancharantnas (cinco jóias) invocou-o no seu poema lírico-dramático Gita Govinda sendo nisto imitado pelo próprio poeta inglês Sir Edwin Arnold no seu “The Indian Song of Songs”.

Diz uma lenda religiosa que estando ausente Sivá, o terceiro deus da Trindade, também conhecido sob outros nomes nas diversas seitas, o qual fora de peregrinação às brancas regiões celestes dos flocos nevados dos Himalaias, a sua esposa Parvati teve um belo dia a ideia de moldar de barro uma figura, com auxílio da água lustral que deslizava do seu corpo a banhar-se segundo os ritos religiosos, Parvati incutiu-lhe espírito, assim nasceu Ganesh. Ora esta figura, transformada acto contínuo, num robusto jovem, todo cheio de vida, uma bela estampa de rapaz afinal foi incumbido pela ‘mãe’ Parvati da missão de guardar fielmente, os aposentos e a sua residência, opondo-se à entrada de quem quer que fosse.

Volvidos doze anos, volta Sivá da sua peregrinação aos Himalaias: mas encontrando à porta o fiel guardião Ganesh que o não conhece e assim não o permite entrar segundo as ordens da “mãe” Parvati, Shivá, com a sua adaga faiscante, vibra-lhe um único golpe cintilante e a cabeça do pobre Ganesh, rola pelo chão numa arrepiante poça de sangue. Aos ruidosos, sinais de encontro dual, sai para fora a deusa Parvati que, com olhos naturalmente rasos de lágrimas e contando ao seu esposo Shivá como ti (segue na 2a pagina) nha criado Ganesh, suplica-lhe que o ressuscita. Shivá, porém não querendo trazer a cabeça doutro individuo, decepa a cabeça ao melhor elefante e coloca-a no corpo acéfalo do Ganesh – razão por que ele é representado agora com a cabeça elefantina, tendo nas quatro mãos que significam o poder, um machadinho, um dente, um ladú e um certo tridente.

A par desta lenda, há outras – como a que diz respeito às fases da lua – acerca de Ganesh, inspirador dos bardos e dos intelectuais, deus das artes e... amigo da guloseima.

Bicaji Ganecar - Sonho d'Amor (1969)

Ao ver-te andar tão cheia de graça
Tanta coisa em mim se passa
O sangue a correr
Acelerado
A mente a querer
Sentar-se ao lado,
E pensar, pensar
Quando te adorar.

O vento a beijar
Teu cabelo liso
E um ritmo preciso
No teu andar...
Com o fulgor
De tanta graça
Se enche a taça
Do nosso amor.

Para eu compor
Esse canto de amor
Tive de abrir
Meu coração
Inda a florir
Para cantar
Essa canção
Em teu louvor.
E rivalizar
O sonho
Tão risonho
Do nosso amor.

Traduzido do original concani por Remígio Botelho.

Augusto do Rosário Rodrigues - Goa Doirada (1980)

Goa! Rua Direita – um mar de gente!
Cheiro a cravo e canela, e erva cheirosa;
Fidalgos, chatins, frades; de repente
Quedam vendo uma jau passar dengosa.

Casal nobre: o marido sempre ausente
Por amor duma naire mui ciosa;
A mulher um Romeu adolescente
Recebe, de saiote cor de rosa.

Há roncos lá no Cais da Ribeira;
Elefantes d’el rei puxam madeira.
Reinol já pobre implora um xerafim.

Luís Vaz de Camões e seus amigos
Portugueses de fibra, dos antigos,
Vendo isso exclamam: Goa! Eis o teu fim...

O Escritor Orlando Costa (1975)

Este escritor apresentou ao I Congresso dos Escritores Portugueses a seguinte comunicação intitulada “Reflexões sobre a Liberdade de Criação, Condicionamentos e Liberdades Concretas”:

1 – Ao abordar o tema proposto “Criação Literária, Sua Especificidade ou Instrumentalidade”, apontaria desde já uma pequena mas significante correcção. “Criação Literária, Sua Especificidade e/ou Instrumentalidade”.

Esta correcção assenta no facto de a alternativa criar uma falsa proposta de problema e por isso – mesmo admitindo-se a situação de alternativa – não se pode admitir a formula copulativa. Se a especificidade de criação literária pertence ao domínio da própria definição e expressão da criatividade do escritor, a sua instrumentalidade é uma característica, um valor, decorrente dela.

Assim, penso que abordar o problema da especificidade da criação literária é ter que chegar, necessariamente aos domínios da sua instrumentalidade, considerando que a actividade criadora do escritor envolve dois sujeitos e dois tempos necessários do conhecimento e da transmissão: e eu e o outro, o a seguir, o necessário e o urgente.

2 – A criação literária, no âmbito da sua originalidade, é um acto privado, não deixando de ser um facto social.

Um acto privado depende da consciência de um homem – neste caso do escritor – e esta consciência, por sua vez, depende de uma vida real, da sua vida quotidiana.

Ora, a vida quotidiana traduz uma “condição” subjacente: condição humana, condição social, não obstante factores específicos temperamentais de índole e carácter que são, sem dúvida, intervenientes na criação e porventura dos mais importantes e que dão o “tonus” àquilo que poderíamos chamar correctamente “a individualidade da criação na liberdade de criação.”

Todos têm a sua “condição”. Os escritores também. A sua criação literária depende da consciência privada – dos seus limites – e da sua “condição” – contexto básico em que interferem factores mutáveis sócio-económicos e políticos. Na antimonia entre estas duas realidades, definem-se, efectivamente, as fronteiras mais ou menos estáveis do campo onde, com maior ou menor exercício de liberdade, se exprime a capacidade criadora do escritor, como homem “situado” que é.

E aqui convém frisar que esta capacidade do escritor e o seu conhecimento das necessidades apontadas pela sua “condição” são, além de tudo o mais, dentro do âmbito das condições de criação literária, responsáveis pela conquista incessante da liberdade – a liberdade daquilo que escreve e como escreve, das opções temáticas e dos modos de comunicação.

Todos têm a sua “condição”. Os escritores também. A sua criação literária depende da consciência privada – dos seus limites – e da sua “condição” – contexto básico em que interferem factores mutáveis sócio-economicos e políticos. Na antimonia entre estas duas realidades, definem-se, efectivamente, as fronteiras mais ou menos estáveis do campo onde, com maior ou menor exercício de liberdade, se exprime a capacidade criadora do escritor, como homem “situado” que é.

E aqui convém frisar que esta capacidade do escritor e o seu conhecimento das necessidades apontadas pela sua “condição” são, além de tudo o mais, dentro do âmbito das condições de criação literária, responsáveis pela conquista incessante da liberdade – a liberdade daquilo que escreve e como escreve das opções temáticas e dos modos de comunicação.

A especificidade da criação literária radica-se nessa liberdade de opções e capacidades individuais e, ao exprimir-se, essa criação passa de um nível de acto de responsabilidade privada a um nível de facto de responsabilidade social, tanto quanto provoca uma participação do publico com que comunica.

A especificidade da criação literária radica-se nessa liberdade de opções e capacidades individuais e, ao exprimir-se, essa criação passa de um nível de acto de responsabilidade privada a um nível de facto de responsabilidade social, tanto quanto provoca uma participação do público com que comunica.

3 – Mas a liberdade que a criação literária reclama e que um escritor a todo o momento tem de conquistar como é que é assumida? Isoladamente? Individualmente? Isoladamente, não. Individualmente, sim, mas não apenas, porquanto a sua perspectiva – com todo o respeito pela sinceridade, coragem e coerência do escritor consigo próprio – está comprometida no exercício de uma liberdade que, quer queira ou não, o ultrapassa como sujeito individual. A liberdade de criação não é mais do que a consciência e conhecimento da própria necessidade de criar e comunicar, que, por sua vez, ao transformar-se em actividade participa de um conjunto social.

E a necessidade de criar contém em si os gérmenes combináveis de observação e da participação. Quando reflectimos e imaginamos não estaremos já a ser mais participantes do que apenas espectadores? Sem dúvida. Um escritor é, por natureza, um “espectador observador”. A sua capacidade criadora, porém (de descobridor, de recriador – que é afinal toda a sua possibilidade inventiva de perspectivar a realidade), acaba por se revelar um instrumento mais ou menos activo na transformação do conhecimento do real humano.

Entenda se por real humano o mundo interior que todos temos e carregamos ao longo dos dias e dos anos e o mundo exterior, que aquele reflecte, e em que inseridos, marginalizados ou não, mas sempre “situados”, nós atravessamos ao longo dos mesmos dias e dos mesmos anos.

4 – No plano da criação literária esse real humano poderá ser definido como o convívio entre a consciência privada do escritor e as motivações e solicitações da realidade circundante – física e social, sensível, inteligível e transformável.

Ao falar em realidade social convém salientar o que anteriormente já se apontou como sendo a “condição” do escritor numa dada sociedade. Não se está a referir ao escritor como classe profissional, mas como homem social, isto é, como “parte de um processo social”. Da sua inevitável inserção numa dada estrutura em que relações sociais de um certo tipo dominam os fluxos da história, resulta que a sua actividade criadora acarreta inevitavelmente consigo aquilo a que poderíamos chamar uma provocação de instrumentalidade no seio da sociedade, na medida em que não se pode abstrair a criação literária das vias de comunicação. A criação literária envolve indissociavelmente “aquilo que se comunica, a quem e como se comunica.”

Todo este processo propõe, efectivamente, ao escritor a saída da sua consciência privada, o transpor para um encontro de identificação da sua necessidade criadora com uma determinada ideologia. Projecta-o para uma possível consciência colectiva, para uma aferição constante entre a sua necessária liberdade de criação e as liberdades concretas a que num dado momento histórico o ser social tem acesso activo, dentro das raízes culturais e dos problemas do povo que o integra, dentro da sua própria nacionalidade – única via profunda para a universalidade.

E na afeição constante entre a liberdade de criação literária – que se exprime por uma linguagem que é um instrumento colectivo vivo – por linguagens novas que só se criam e fecundam em situações novas ou em vias de renovação e as liberdades concretas que se situam em toda a sua extensão a inegavelmente instrumentalidade da criação literária.

Essa instrumentalidade é, pois, técnica e ideológica. Enquanto técnica, sempre necessária e porventura urgente por ser ideológica.

Nas capacidades criativas e expressivas de cada escritor, reside a especificidade da criação literária, ao mesmo tempo que é no conhecimento dinâmico da sua condição social no mundo e da responsabilidade oficinal que assume ao recorrer a uma via de comunicação que é a escrita, que se reconhece a sua instrumentalidade, a um tempo linguística e social.

António Araújo - Duplo Sentimento (1975)

Fui no Domingo visitar
A cama d’um hospital
Um antigo amigo meu
Quando me vinha para retirar
Notei um certo sinal
Que outro doente me deu.

“Ouça bondoso senhor
Se acaso de mim se int’ressa
Por caridade não parta
Por Deus, faça-me um favor
Se não levar muita pressa
Escrevia-me uma carta.

Assim me fez comover
Era o único doente
Que ali não tinha ninguém
Preparei-me para lhe escrever
Ditando ele tristemente:
“Minha boa e santa mãe...

Sei que vives arrastada
E durante a vida inteira
Só te persegue a desgraça
Não podes, não tragas nada
Vem-me ver na quinta-feira
Que a visita é de graça

Chega a hora da visita
Não te vejo aparecer
Fico cheio de anciedade
Pois, mãezinha a credita
Que só depois de te ver
Poderei morrer à vontade”

Depois de a carta fechar
Com meu coração entre abrolhos
Preparei-me e disse-lhe adeus
Não pude mais suportar
Vi-lhe as lágrimas nos olhos
E senti chorarem os meus.

Tuesday, 5 March 2013

António Colaço - Floriano Barreto (1965)

Estaria o espírito do Poeta já dominado por um vago pressentimento quando adoptava, para o seu primeiro e último livro, o título de “Falenas”? De asas queimadas aos vinte e oito anos, o seu estro iria extinguir-se abruptamente, antes de nos poder dar a plena curva do seu voo, que teve altos e baixos caprichosos, ameaçando cair às vezes numa espécie de poesia rimada e erguendo-se outras às mais radiosas e brilhantes promessas!

Falenas esvoaçando lugubremente no ar, os seus versos deixam, em geral, um travo de amargura, tanto mais que o seu pessimismo – como ele próprio o nota no seu Prólogo – não é uma planta de estufa, mas é sincero e vivido, e nós o vemos exteriorizar-se nestes versos, um tanto arrepiantes e mordidos de ironia, a que deu o prosaico título de “Pessimismo e Instinto de Conservação”:

Reis da Criação! Reis da feira! Reis de nome,
Que Doença, Mágoa, Mal, Paixão, Dúvida, Instinto,
Tudo nos escraviza e tudo nos consome,
Com que ironia o digo e com que pena o sinto!

Há encantos na existência: uma dúzia de pérolas
Perdidas na amplidão dum oceano sem termo.
Não podem saciar o coração enfermo,
Lacerado ao vaivém das grandes vagas cérulas.

E, apesar de eu saber esta verdade séria,
Só nas horas cruéis de aflições e de luta,
Almejo a paz final, soberana e absoluta.

O horror da destruição! A algema da matéria
É tão dura e pesada, é tão sólida e forte
Que eu não posso chamar a sangue frio a Morte!

Floriano Barreto já trazia decerto latente, mesmo “no viço dos seus vinte anos”, aquele germe mortal que, daí a oito e poucos anos, o postraria no túmulo, na cidade do Porto, aonde o levaram ânsias novas e novas esperanças. Os seus amigos, que os deixara dos melhores em Goa, coligiram piedosamente um “Livro Póstumo”, com o apoio do “Heraldo”, de que fora colaborador, de Menezes Bragança, António de Noronha, Fernando Leal, Roque Correia Afonso e outros, algums poemetos selectas das “Falenas”, uns poucos de inéditos e as suas interessantes prosas dispersas pela imprensa goesa. Nestas, Floriano Barreto esboça ricos e coloridos quadros ou risonhas e flagrantes caricaturas, à volta de certos temas e aspectos regionais, com notações criticas por vezes aceradas, tudo atravessado de um fundo e entranhado amor a este “abençoado ninho paterno”. Certos trechos dos “Campos”, das “Florestas”, dos “Montes”, e o seu curioso estudo critico do Mando, os serenos protestos contra o arremedo simiesco dos que nos vem de fora, o vivo e minucioso registo de tantos costumes sociais porventura “prestes a extinguir-se”, as suas largas pinceladas sobre a música, a pintura e a cerâmica locais, as suas discretas charges de reformador sócia, mesmo a sorridente e ingénua apologia do “Arroz e Caril” (tema que seria, mais tarde, retomado com particular brilho por Wolfango da Silva), tudo siso nos revela um escritor fino e por vezes profundo, pondo deliberadamente o seu talento ao serviço da sua terra que, como intelectual e como artista, devotada e filialmente amou.

É sabido que os poetas goeses tiveram uma predilecção especial pelos motivos recolhidos do vasto espólio cultural da Índia e pela criação de telas dum característico colorido oriental. Assim sucedeu com os maiores, como Nascimento Mendonça, Paulino Dias, Adeodato Barreto. A imaginação poética, a transposição da realidade para o Sonho, o ritmo e a música, a subtil gama da emotividade humana, que caracterizavam a poesia (deusa esquiva que poucos se atrevem a desvendar ou definir) assumem, no estro dos nossos poetas, uma expressão e tonalidade mais ricas quando se levanta o pano sobre o exuberante panorama cultural indiano. Floriano Barreto fá-lo até deliberadamente, na secção primeira das “Falenas”, subordinada ao título “Indianas”, como contribuição poética “para o centenário da Índia” (em 1898). A evocação da suave lenda do Sindrimal, essa briosa e resplendente flor que o ciúme leva a fechar a corola à passagem do Sol infiel; o triste fado da “bailadeira da Índia”, cantado em estrofes umas vezes fulgurantes e, outras, lendas e monótonas, descaindo por vezes naquilo que se chamaria a poesia didáctica ou insossamente moralista, mas sempre repassadas de um largo e generoso sopro de ternura humana...

Tilintam os guisos: tchinn. Saranguis lentamente
Desprendem pelo espaço em lânguidas doçuras
Harmonias de amor aveludadas, puras,
Que embalam a noss’alma em um sonho dolente.
...

Flutuam-te na esteira eflúvios profundos,
Aromas de tchampins e lírios cetinados.
Toma a tua dança o ondear da palmeira.
Fascina a gente! Bate os guisos, feiticeira,
Que despertarás sempre em corações devassos
Frémitos de volúpia e lânguidos cansaços
E, numa alma de luz, num espírito forte,
Sentimentos de dó, de compaixão de pena...

A apoteose da nossa divindade tutelar e fagueira – o Coqueiro –; o vibrante látego zurzido contra o Satil tudo isso documenta bem quanto o fecundo veio oriental poder seduzir e alimentar a inspiração dos nossos poetas.

Claro que Floriano Barreto, a símile do que sucede com os demais poetas goeses, traindo o humani nihil que é a partilha de todo o homem superior vai também desferindo o voo por outras esferas, dando-nos ora o grito angustiado do “Fragmento”, ora uma tentativa de sátira em “Os Cães”, ora as rendilhadas filigranas do “Floco de Neve” ou das “Nuvens”, ora ainda esse lúgubre lamento que encerra as “Falenas”, com estes dois versos de melancólica toada anteriana:

Meu pobre coração desiludido volta
Para a mão de Jesus e lhe dorme no seio.

Como simples indicações do rico potencial de energias e virtualidades que o estro de Floriano Barreto continha e que a morte veio desapiedadamente reduzir a um punhado de cinzas, podemos ter diante dos olhos este tríptico de inspiração dessemelhante e que, apesar de certas imperfeições de somenos importância, denunciam um talento maleável e capaz de mais altos voos:

1 O Inquisidor

O padre inquisidor sombrio e carrancudo
Completa a digestão e cisma na varanda.
Hora crepuscular, deliciosa, branda.
No alto, o céu claro tem maciezas de veludo.

Em baixo, no jardim, como a água emperla tudo
E em veios de cristal deriva em toda a banda
Relvas, flores de mimo e tulipas de Holanda,
Repuxos expluindo íris de luz!... Contudo,

Esse olhar duro, afeito às torturas dos outros,
Às tenazes, prisões, cavaletes e potros,
Não se enternece e ri ante o painel formoso.

... A pupila, porém, de alegria se inflama
quando o sol, entre o incêndio e entre línguas de chama,
cai num auto-de-fé magnífico pomposo!

II Aguarela

Vai descendo o rebanho e balando nos ares.
A encosta da colina em breve se mosqueia
De dorsos de animais que, à volta, têm na ideia
O curral que lhes dá o conhego dos lares.

Os pegureiros vão em rápidos folgares
Descrevendo os ziguezagues do trilho que serpeia
E, nas frautas de cana, em doce melopeia,
Vão tangendo de leve amorosos cantares.

E esmorzando de manso umas árias estranhas,
Motivos ideais, baladas de montanhas,
Ritmos duma doçura infinita e tranquila,

Música tão singela e doce e primitiva,
Que a Vésper irradiante a viva
Desponta expressamente e põe-se do alto a ouvi-la.

III Via Láctea

Quando tu vais por esses caminhos
Onde aves cantam e fremem ninhos,
Não se magoam os teus pezinhos?
Oh! Se eu tivesse o poder criador,
Não punha a via láctea nos ares,
Tão branca como a espuma dos mares,
Assim a punha para tu pisares, meu amor!

Eu constelava-a de muitos Sírios,
Eu alastrava-a de muitos lírios,
Eu cravejava-a de muitas gemas,
Eu perfumava-a de muito aroma,
Eu sombreava-a de muita coma,
E, com as minhas forças supremas,
Dava-lhe tudo, dava-lhe tudo.

Oh! Se eu tiver o poder criador,
Não punha a via láctea nos ares,
Tão branca como a espuma dos mares,
Assim a punha para pisares, meu amor!

Para que enfom por esses caminhos,
Onde aves cantam e fremem ninhos,
Não se magoem os teus pezinhos, meu amor!

Fale, pois, o Poeta por si mesmo, por entre sorrisos de aurora e agonias de sol-pôr sofrendo e sonhando, derramando a sua alma em versos candentes ou brandos, na curva caprichosa da sua imaginação triunfal ou... doente. Ó pessimismo, a dúvida, o desalento, a dor são a nota dominante da sua exígua produção literária, que ficará contudo como um dos momentos felizes das Letras goesas, que floresceram sobretudo a partir dos fins do século XIX e hoje vão rumando por outros horizontes porventura mais amplos e pretensamente universais.

Como me encantou, na sua despretensão e singeleza, a terna dedicatória que Floriano Barreto traçou – além da que consta, em letra de forma, na terceira página das “Falenas” – logo no verso da primeira página num cursivo delicado e nervoso:

A meus queridos pais e irmãos
Que esta flor do meu espírito
- primeira flor tão modesta –
vá perfumar com empenho
num petulante dar de festa,
o muito amor que vos tenho! 

... A primeira e última flor de tão fino, nobre e elevado espírito!