O caro leitor já comprou um fato, não é verdade? Pois não se admire com a pergunta, porque, quase sempre, encarregamos disso as nossas consortes (a palavra não quer significar que elas seja “um poço de sorte” por nos terem conhecido) e elas é que tratam da escolha do padrão, discutem o preço, pedem para cortar uma polegada mais alegando que a fazenda encolhe, enfim, revolvem uma loja põem à prova a resistência dos nervos do empregado do balcão, e no final descobrem um defeitozinho que justifique um desconto de oito tangas.
Insisto, pois, com o caro leitor!
- Já comprou tecido para uma fatiota?
- Já, sim senhor!
- Esplêndido! Eu, também.
Ainda há dias entrei num estabelecimento da capital, e, com aquele ar superior de quem tem muitas Quintas lá na terra (é corrente ouvir-se: ‘tenho umas quintazinhas lá na aldeia que me dão umas quantas pipas’) disse para o empregado: “Ora eu quereria uma fazenda para fato... e o homem nem de deixou dizer mais nada, correndo solicito para as prateleiras e tirando a fazenda que lhe parecia, a matar para a minha aparência de proprietário de ‘Quintas’. O patrão interveio para elogiar o tecido e a afirmar “sob sua palavra” que o mesmo não perdia a cor, sendo baratíssimo para a qualidade. Não deixei que acabasse o seu brilhante discurso. Atalhei-o quando, possivelmente, iria cair no capítulo de mais difícil digestão: o preço. Disse-lhe que sim senhor, que estava encantado com o padrão e a qualidade, que há muito procurava em todas as lojas aquela fazenda e, por não ter encontrado, já tinha desistido de a comprar. Feliz a hora em que tinha trasposto as portas do seu estabelecimento, porque via renovarem-se as esperanças de adquirir o fato com que há muito sonhava. Pena é que hoje não possa ser – disse-lhe eu. Retomei aquele ar de proprietário de Quintas (tenho uma todas as semanas) e atirei-lhe, olhando por cima dos meus óculos: Sabe, eu hoje – e acentuei com ênfase a palavra ‘hoje’ – quero uma coisa qualquer, daquelas ‘para bater’, um tecido inferior, de baixo preço.
O dono da loja, retribuindo em hipocrisia, afirmou que ia apresentar imediatamente o que eu desejava, artigo muito bom, de categoria e baixo somente no preço... um preço módico de 6 rupias a jarda. Mesmo assim fiz encher de peças o balcão (quanto aprendemos com as mulheres!), e foi preciso recorrer a um catálogo de amostras para escolher o padrão mais harmonioso com o tom da minha tez (tanta exigência chega a ser uma tristeza!). Três jardas cortadas, pago o custo... e um pedido que quase nunca fazemos: “se não se importa passa-me uma notazinha... só para ficar com o nome da Casa... o senhor foi tão amável!...”. Acrescentei ainda, “não posso esquecer esta fazenda!...”
Dois dias depois recebia em recado pelo qual o alfaiate – aquele que empresta alguma estética ao fardo que arrasto – me existia “mais um palmo” de tecido para a gola.
Eis-me de novo no estabelecimento que possui a jóia de fazenda que eu disse ambicionar e que nunca desejei nem em sonhos. Atende-me um outro empregado.
- Olhe, eu queria um palmo desta fazenda... um momento... tenho aqui a amostra.
O rapaz procurou por aqui e por ali, acabando por encontrar a mesma peça donde tinham sido cortadas as preciosas três jardas de calibre 6 (segue na quarta pagina)
(seis rupias, claro!).
- Posso cortar? É somente um palmo que deseja, não é verdade?
- Sim, corte!
- Quanto é?
- Ora, a sete rupias a jarda...
- A sete rupias a jarda? Mas está enganado!
- Não... não... Como sabe a nossa casa tem preços fixos... e não podemos baixar nem uma poiçá...
- ... Mas está provado que podem subir!
- Não, nunca! Temos a maior consideração pelo freguês etc etc.
- Então como me explica que eu tivesse comprado esta fazenda, desta mesma peça, a 6 rupias?
- V. Exa. está equivocado.
Calmamente procurei no meu porte-papéis a factura do dia 30 de Março (sim, compras só no fim do mês) e submeti-a a cuidadosa apreciação do leal zelador do “Preçário” da “casa dos preços fixos”. O moço desatou a abanar a cabeça com a rapidez dum pêndulo de relógio que adianta oito horas nas vinte e quatro, e respondeu: “Sim... Senhor pode levar.”
E assim, por ter solicitado uma factura, salvei-me de perder umas tangas num palmo de tecido “para bater”... mas ainda hoje penso se naquela casa de “preços fixos” se não teria verificado um fenómeno físico que o empregado não me soube explicar. Vejamos o caso: quando comprei as três jardas, - há muito as chamadas lâmpadas eléctricas tentavam imitar os lumes dos diuleiôs, corria um ventinho agradável e a temperatura era bastante amena; três dias passados quando comprei o tal “palmo de fazenda” batiam as 16 horas, o sol escaldava, tudo estava quente como brasa. Não teriam os preços sofrido, com a subida de temperatura, uma dilataçãozinha... ali, naquela casa de PREÇOS FIXOS?
Insisto, pois, com o caro leitor!
- Já comprou tecido para uma fatiota?
- Já, sim senhor!
- Esplêndido! Eu, também.
Ainda há dias entrei num estabelecimento da capital, e, com aquele ar superior de quem tem muitas Quintas lá na terra (é corrente ouvir-se: ‘tenho umas quintazinhas lá na aldeia que me dão umas quantas pipas’) disse para o empregado: “Ora eu quereria uma fazenda para fato... e o homem nem de deixou dizer mais nada, correndo solicito para as prateleiras e tirando a fazenda que lhe parecia, a matar para a minha aparência de proprietário de ‘Quintas’. O patrão interveio para elogiar o tecido e a afirmar “sob sua palavra” que o mesmo não perdia a cor, sendo baratíssimo para a qualidade. Não deixei que acabasse o seu brilhante discurso. Atalhei-o quando, possivelmente, iria cair no capítulo de mais difícil digestão: o preço. Disse-lhe que sim senhor, que estava encantado com o padrão e a qualidade, que há muito procurava em todas as lojas aquela fazenda e, por não ter encontrado, já tinha desistido de a comprar. Feliz a hora em que tinha trasposto as portas do seu estabelecimento, porque via renovarem-se as esperanças de adquirir o fato com que há muito sonhava. Pena é que hoje não possa ser – disse-lhe eu. Retomei aquele ar de proprietário de Quintas (tenho uma todas as semanas) e atirei-lhe, olhando por cima dos meus óculos: Sabe, eu hoje – e acentuei com ênfase a palavra ‘hoje’ – quero uma coisa qualquer, daquelas ‘para bater’, um tecido inferior, de baixo preço.
O dono da loja, retribuindo em hipocrisia, afirmou que ia apresentar imediatamente o que eu desejava, artigo muito bom, de categoria e baixo somente no preço... um preço módico de 6 rupias a jarda. Mesmo assim fiz encher de peças o balcão (quanto aprendemos com as mulheres!), e foi preciso recorrer a um catálogo de amostras para escolher o padrão mais harmonioso com o tom da minha tez (tanta exigência chega a ser uma tristeza!). Três jardas cortadas, pago o custo... e um pedido que quase nunca fazemos: “se não se importa passa-me uma notazinha... só para ficar com o nome da Casa... o senhor foi tão amável!...”. Acrescentei ainda, “não posso esquecer esta fazenda!...”
Dois dias depois recebia em recado pelo qual o alfaiate – aquele que empresta alguma estética ao fardo que arrasto – me existia “mais um palmo” de tecido para a gola.
Eis-me de novo no estabelecimento que possui a jóia de fazenda que eu disse ambicionar e que nunca desejei nem em sonhos. Atende-me um outro empregado.
- Olhe, eu queria um palmo desta fazenda... um momento... tenho aqui a amostra.
O rapaz procurou por aqui e por ali, acabando por encontrar a mesma peça donde tinham sido cortadas as preciosas três jardas de calibre 6 (segue na quarta pagina)
(seis rupias, claro!).
- Posso cortar? É somente um palmo que deseja, não é verdade?
- Sim, corte!
- Quanto é?
- Ora, a sete rupias a jarda...
- A sete rupias a jarda? Mas está enganado!
- Não... não... Como sabe a nossa casa tem preços fixos... e não podemos baixar nem uma poiçá...
- ... Mas está provado que podem subir!
- Não, nunca! Temos a maior consideração pelo freguês etc etc.
- Então como me explica que eu tivesse comprado esta fazenda, desta mesma peça, a 6 rupias?
- V. Exa. está equivocado.
Calmamente procurei no meu porte-papéis a factura do dia 30 de Março (sim, compras só no fim do mês) e submeti-a a cuidadosa apreciação do leal zelador do “Preçário” da “casa dos preços fixos”. O moço desatou a abanar a cabeça com a rapidez dum pêndulo de relógio que adianta oito horas nas vinte e quatro, e respondeu: “Sim... Senhor pode levar.”
E assim, por ter solicitado uma factura, salvei-me de perder umas tangas num palmo de tecido “para bater”... mas ainda hoje penso se naquela casa de “preços fixos” se não teria verificado um fenómeno físico que o empregado não me soube explicar. Vejamos o caso: quando comprei as três jardas, - há muito as chamadas lâmpadas eléctricas tentavam imitar os lumes dos diuleiôs, corria um ventinho agradável e a temperatura era bastante amena; três dias passados quando comprei o tal “palmo de fazenda” batiam as 16 horas, o sol escaldava, tudo estava quente como brasa. Não teriam os preços sofrido, com a subida de temperatura, uma dilataçãozinha... ali, naquela casa de PREÇOS FIXOS?
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