Tuesday 6 March 2012

Bailon de Sá - São João Baptista (1975)

Precursor: qual aurora do esplendor
Do Sol, transluzindo no horizonte,
Cândido, mas terrível no fervor
Do seu verbo mordaz e escandecente.

Na sua base a montanha estremeceu,
E turgesceu-se o vale como um seio
(como o mar encapela um escarcéu)
mordido por um velho e doce enleio.

Contorce Herodias no seu leito
Adúltero – qual verme numa brasa –
Urdindo a negra trama no seu peito,
P’ra extinguir o remorso que lhe abrasa.

Em ritmos de volúpia, Salomé
Vem dançando perante o ignóbil rei,
E quase a volitar, pé ante pé,
Da aproxima-se e diz: “mãe, não sei,

Ao Tetraca que devo eu lhe pedir,
Pela galharda oferta que me fez?
Um sinistro clarão trai-lhe o sentir
“Ah! Já tenho nos dentes a minha rês:

Nesta salva a cabeça do Batista!”
Cochicha... Triste o rei, acede porém.
E sem mais, Salomé, lúbrica artista
E pôs na mãos crispados da sua mãe.

Cabeça do Batista, eis a Verdade,
Que nós em vão tentamos degolar:
Há Rhodanos na senda da Maldade,
Que, às furtivas, se podem congelar!

(Nota) Diz uma lenda que Salomé, quando a caminho de Lião, acompanhada de sua mãe e Herodes, ora destronados e exilados, atravessava o Rhodano, vendo-o coberto de gelo, quis patinar, mas ficou submergida até o pescoço. Enquanto estrebuchava, o gelo foi-se, aos poucos, apertando-a como um garrote, até que a cabeça ficou separada do tronco.

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