Thursday, 15 March 2012

Telo de Mascarenhas - Jawaharlal Nehru, Homem de Boa Vontade (1975)

Em meados de Setembro de 1948 haviamos chegado a Nova Delhi, de regresso a Portugal, deslumbrados e curiosos de conhecer a vida da Índia Independent. Setembro é um mês ameno, com maciezas de veludo no ar, pronúncias do Outono, que é a estação mais deleitável do ano.

A um motorista do carro estacionado no parque de Hotel, um Sickh, de barbas façanhudas de Ali Baba, dou o endereço: “Panditji Ghar” (casa do Pandit). Em Nova Delhi todo o mundo conhece a casa do Primeiro Ministro Pandit Jawaharlal Nehru. Era como o “Abre-te, Sésamo!”. Uma palavra mágica que criava boa vontade e obtinha todas as facilidades.

A residência do Primeiro Ministro Nehru, no Teen Murti, rodeada de um vasto parque e jardins em plena floração, na manhã em que lá chegaremos, estavam cheios de sol e aromas. Canteiros de rosas vermelhas, amarelas e da cor de púrpura, flores favoritas de Nehru (talvez porque o seu nome, Jawaharlal, quer dizer rosa vemelha dedicada à Deusa Kali). Ele trazia sempre a florir na botoeira do seu Sherwani um botão de rosa.

Uma vez, volvidos anos, sobre a nossa entrevista e quando vivíamos em Nova Delhi, Nehru presidiu às cerimonias do Dia de Independência, no Forte Vermelho, com uma rosa amarela na botoeira do seu Sherwani. Como estivéssemos próximo, perguntamos-lhe:

“Desespero, Excelência?”

“De modo nenhum. Felicidade,” disse Nehru, sorrindo, talvez regozijado da nossa ignorância acerca do significado das cores na Índia. Segundo a convenção ocidental, amarelo significa desespero e desolação.

Naquele tempo, logo após Independência, havia grande escassez de géneros alimentícios em toda a Índia. Nehru, então, não só aconselhou o povo a cultivar hortaliça, cereais, como ele próprio os nos largos talhões do seu parque para suplementar sua mesa com tais géneros.

Quando Nehru acabou de conversar com um grupo de pobres refugiados, vítimas da partilha da Índia, na sala de espera, eu declinei a minha identidade e apresentei-lhe as credenciais (cartas que recebera em Portugal), e ele, prontamente, conduziu-me para a sala de visitas, ampla, confortável e soalheira, deitando sobre o jardim em flor, com as paredes ornamentadas com os retratos de quase todos os líderes asiáticos.

Após a conversa convencional entre duas pessoas que se conhecem pela primeira vez, o Primeiro Ministro perguntou-nos pelas novidades de Portugal e falou-nos em tom amargurado sobre a situação e do totalitarismo de Salazar e disse: “faremos todo o possível para libertar Goa das garras do colonialismo”. E acrescentou: “Valer-nos-emos primeiramente de meios diplomáticos e como ultima ratio , doutros meios aconselháveis pelas circunstâncias.”

“Após a Libertação que futuro de Goa, Excelência?”

“Goa será um estado autónomo dentro da Índia, preservando a sua língua e cultura e, até a língua e cultura portuguesas, seus usos e costumes, para que Goa e Pondicherri sejam duas janelas na Índia abertas sobre o Ocidente. Não queremos que Goa perca a sua identidade, as suas crenças e o seu modo de vida” asseverou Nehru.

O Primeiro Ministro Nehru era uma pessoa bastante azafamada, com mil problemas a solver no limiar da Libertação. Era também pessoa cheia de vida e dinamismo. Não quisemos abusar da sua bondade e cortszia com que nos recebera apesar de andar atarefado. Autógrafos numa fotografia sua e no “The Discovery of Índia”, duas lembranças suas, põem ponto final a nossa tão desejada entrevista.

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