Monday, 15 July 2013

Clara de Menezes - Travo de Amargor (1977)

Gosto de estar na penumbra no presente,
Queima-me a ardente luz do teu olhar,
Sei que não é propósito magoar
Quem te adora até perdidamente.

O meu coração disso se ressente,
Mas não posso fugir ao duro azar,
Que anda a açoitar o nosso quente lar,
Com máscara a fingir-se alvinitente.

Estou na escuridão sem alvorada,
Que bela será a rósea madrugada
Se me vier tirar deste torpor!

Sei conquistar a real felicidade,
Lutar contra a maré da adversidade,
Mas evitar o travo de amargor!

Agostinho Fernandes - Quadro Vivo (1955)

Um quadro vivo que parece raro porque é... clandestino. Recém-casados. Lar ideal. Ricos e felizes. Todos comentam: uma perene lua de mel.

Ele trabalha num escritório e ri-se: lembra-se do antigo namorado da sua esposa. Era efeminado, franzino e fora despedido quando este entrar em cena. Era uma vitoria. A primeira vitória. Não era, pois, verdade o que os seus colegas disseram. Não era idiota e gebo afinal. Até a mulher gostara... e casara. Agora ela só a ele amava, a ele, o marido. Este adorava-a. Idolatrava-a.

Ainda ontem ela dissera: vou ser mãe. Que satisfação. Que júbilo! Ele? Pai?! Morria de alegra!

Voltava sempre às Ave-Marias. Eram logo beijos e abraços... um nunca mais acabar.

Naquele dia pensou voltar cedo. Uma surpresa para a esposa adorada. Presentes. Chapéus. Perfumes, e umas rendazinhas para o bebé. Entrou como de costime, sem bater a quase desmaiou: ele conspurcando-lhe o sagrado tálamo nupcial. Ele, o efeminado, o que fora despedido!

José Rangel - O Poeta e o Amor (à volta do livro 'Destino' de Judite Beatriz de Sousa) (1955)

A poesia é a quintessência do do sentimento humano. E ela a intérprete fiel e sagrada de toda a gama de sentimentos que palpitam na alma humana.

Nos seus versos, que têm, por vezes, a extensão dum sorriso ou duma lágrima, todo um mundo de volúpia e sofrimento, de anseios que arroubam, de desilusões que ferem.

Se na prosa, o homem pode elevar às alturas a sua arte, é na poesia que ela se sublime, quando tocada pela asa de espiritualidade, por aquela unção religiosa que a envolve por vezes, dum halo e misticismo...

O poeta é um ser superior, por que ultra-sensível. Qualquer sentimento, o mais banal, vibra nele com uma intensidade dolorosa, e se constela dum manto de estrelas, que espargem poalhas de luz, cujo brilho, não ilumina, muita vez, os olhos prosaicos, porque a distância que os separa é imensa...

É por isso, que o poeta é considerado um ser à margem das realidades tangíveis da vida e é apodado de sonhador...

Não! O poeta não vive de quimeras. Mas arrancando da realidade a sua própria carne que lateja e uiva, tece-lhe uma grinalda de flores, envolve-a de um manto diáfano de fantasia, para cobrir a nudez forte da verdade... E como o olhar humano não é bom psicólogo, e vê as coisas pela rama, isso o leva a julgar que o mundo do poeta é fictício, ilusório...

O poeta é um iluminado. Com aquela visão profunda que perscruta a alma dos homens e das coisas, ele ausculta em pequenos nadas da vida, o mistério que vive nele.

Que tem de extraordinário, um sorriso que se entreabre cândido e meigo ou um suspiro que se evola choroso e compungido? É tão banal! Mas o poeta entrevê através a névoa que os cobre, almas que ora se banham de alegria, em que há sonhos doirados que se corporizaram, promessas ridentes que se cumpriram, ora estremecem de amargura e dor, ante sonhos desfeitos, esperanças desfolhadas..

E como estas pequenas emoções, têm reflexo invulgar na sua alma, elas carreiam para o seu estro, pérolas, que lhe servirão, para tecer o seu poema.

Como todo o ser humano, o poeta também tem o seu ideal, de que faz o móvel da sua vida, dando-lhe todo o calor da sua alma fremente, e o iluminando daquela luz interior tão suave e tão bela que vive imaculada no sacrário do seu coração.

Mas o seu ideal, é por vezes, incompreendido. Ele sofre com isso. A sua alma amarfanha-se de dor, que lhe anavalha a alma.

Mas, é o próprio sofrimento que o eleva àqueles édenes de beleza a que o seu coração aspira, onde vive uma paz serena e luminosa, que dulcifica a alma e santifica a dor. É ele que cria as estrofes mais belas e mais sentidas.

Diversos sentimentos fazem vibrar a lira do poeta. Mas nenhum deles arranca dela acordes tão maviosos, como esse sentimento subtil e indefinível, que tendo a razão de ser em si próprio, viva do seu próprio sangue que lhe dá cada vez nova seiva; o Amor.

Sentimento dos mais elevados, que fremem na alma do poeta ele exala-o e o transfigura, tornando-o um ser diferente dele próprio.

Sentimento universal, que caldeia no mesmo cadinho, almas nos pares, a palpitarem do mesmo anseio, ele vive de braço dado com a Dor, quando este anseio vive isolado e incompreendido, quando a chama que ilumina uma alma, ao revés de aquecer outras almas só depara com gélida frieza...

O poeta, então, não procura apagar esta chama, mas fazendo dela a lâmpada a alumiar-lhe o estro, vai arrancando do seu alaúde, as mais sentidas endechas. E só depois de extravasado, às vezes duma forma irregular e impulsiva, todo o fogo que arde na sua alma e restar dele só cinzas e o olor duma saudade, é que o poeta depõe por momentos a sua lira, para a retomar e qual paladino do seu coração, continuar a trilhar por outras veredas, à busca de novos rumos para o seu Ideal...

Vem estas considerações ao bico da pena, á propósito do livro de poemas, que a jovem poetisa Judite Beatriz de Sousa acaba de dar à luz da publicidade.

Poetisa de alto quilate, que tem feito a nossa admiração pelos seus versos prenhes de beleza, de há muito esperávamos, que de dispersiva que era a sua lira, ela se enfeixasse num livro de versos, que espelhasse a sua verdadeira, alma de Artista e Mulher.

E cá temos agora “serena, clara, carinhosa, palpitante de viva emoção e humana beleza” a cantar aquilo que na sua alma mais vibrou: o Amor.

Seguindo a máxima de imortal Goethe “faz da tua dor um poema”, ela dá-nos hoje, poemas de admirável contextura, em que a elevação do pensamento e sentimento se alia à singeleza da frase e onde estua uma alma superior, qeu amou, com aquela acrisolada paixão que só os artistas podem ter e por isso mesmo sofreu e hoje se entrega à tristeza e ao abandono.

“O que amei foi tanto e há tanto tampo

Eu tenho as mãos cheias de abandonos...

E todo o mistério de dramas ocultos

A doer os meus olhos tarjados de mágoa”

Estes poemas constituem um longo estendal de amarguras, cuja leitura nos faz comungar do mesmo sentimento que a torturou, mais parecendo que é a nossa alma que neles suspira de dor...

“O meu poema é a minha grande dor

Porque é a mesma dor de toda a gente!”

Só os compreenderá, quem os possa sentir na sua carne e no seu sangue, ou parafraseando Júlio Dantas, é preciso lê-los com aquela mesma ternura com que foram escritos, para beijar a mão que os traçou.

Nestes poemas, sobressai, não só a beleza dos versos mas principalmente a beleza da alma da Mulher, embora eles nos dêem só uma parte dessa alma, pois as palavras por mais eloquentes que sejam, nunca podem traduzir à justa todo um rosário de anseios suspensos, lutas inglórias, e negros desesperos que se agitam na alma humana e os melhores poemas são aqueles que nunca se puderam escrever...

Fernando Namora, p poeta do “Mar de Sargaços” teve este desabafo doloroso, no final dum dos seus versos: “Ah! Covardes versos: nada dizeis do que sinto!”

Nos seus versos, a autora parece seguir a corrente modernista, em que “cada um vive consigo, entrega-se livremente à sua revelação, manifesta-se de acordo com o seu temperamento” e “o “único elo que os liga a todos entre si é o desejo de sinceridade, de quererem ser inteiramente eles, de cada um procurar um seus versos dar-nos a sua maneira própria de sentir, de pensar e de dizer”, sem se sujeitar a cânones estereotipados a que um poeta nunca pode confinar-se, renovação essa que, iniciada por Eugénio de Castro, continuada por António Nobre e ampliada por Mário de Sá-Carneiro e Fernando Pessoa, tem hoje poetas de gema num José Régio, Mário Dionísio, Fernanda de Castro, Mário Beirão, José Gomes Ferreira e outros.

Irmã gémea na poesia de Florbela Espanca (a que a comparou Mário Issac que prefacia o livro), essa “filha da charneca erma e selvagem que é o Alentejo, a Soror Saudade como lhe chamou o poeta Américo Durão, embora os ambientes de ambos sejam diferentes, elas se tocam e se irmanam porque viveu nelas o mesmo sentimento amalgamado de lágrimas.

Não pretendemos, com estas palavras, bordar considerações críticas à volta da sua alma, que não temos fôlego para tanto, mas tão somente, focando à verdadeira luz à sua alma de Mulher e o sentimento que nela germinou e tão bem frutificou, dar-lhe a nossa plena adesão espiritual, a quem cantou com tanta beleza é verdade, sentimentos que não são nossos.

Este livro é o primeiro passo na senda íngreme e dolorosa que é a glória. Temos a certeza que Judite Beatriz de Sousa, com a grandeza do seu espírito e a sinceridade do seu coração, saberá lutar contra todas as vicissitudes e ganhará a palma de glória que é a suprema aspiração de todos os artistas.

Judite Beatriz de Sousa - Certeza (1955)

O que aconteceu agora
Já devia acontecer
- Não me atormentam receios
Porque prendi a verdade

O que devia chegar
Já chegou. E o que vai partir
Tinha também de se ir embora.
- Não me dói o meu anseio
Nem eu tenho de esperar
Pela tristeza da hora.

Estes silêncios não doem
Como incertezas
Ou reticências
Porque tudo o que
Tinha de ser!

Não há mágoa
Nem lembrança
- apenas há esperança
e - porque não – há certeza
de eu já poder esquecer.

Walfrido Antão - Setembro e as Alegrias Campesinas (1955)

Setembro, mês encantador por excelência, é para o goês o período de tempo em que as espigas louras, que madeixas queridas de alguma Madalena, ondeiam ao sabor dos ventos e amadurecem lentamente sob a acção benéfica dos raios solares.

Quando a colheita se aproxima, o agricultor exulta de alegria, pois já não há de sofrer privações nem fome.

A seara apresenta bom aspecto e eis tudo para ele. Manhã cedo, quando rubra aurora ainda se esconde no horizonte, hesitante e prometedor, alguns homens musculados de troncos espadaúdos, cor de azeviche/azevinho, a que o vulgo chama begarins, acompanhados de uma fila de mulheres e raparigas, um rancho de Evas roliças, dirigem-se para a várzea. Lá, foices na mão por entre o canto harmonioso e terno de mandós e dulpodas, ceifam, isto é cortam as espigas que montoados num lugar serão transportadas pelos homens até a eira, onde segue a debulha por um grupo de bois andando sempre à roda e a espiga deixa cair o doirado bate que é levado em cestos para casa do agricultor.

A ceifa, de índole nativa tão original, tão pitoresca, foi cantada por Floriano Barreto em estrofes maviosas que lembram o murmúrio doce e acariciante das manilhas nos punhos das encantadoras ceifeiras.

Natureza bravia, viço, encanto, poesia, tudo se junta nas várzeas. Ali brotam os primeiros anseios de amor. “O amor ao ar livre, na solidão imensa do campo”, de que nos fala Júlio Diniz nas “Pupilas” e Walter Scott na “Dama do Lago” tem a dignificá-lo a sinceridade, franqueza, nobreza de conduta do carácter e ainda o modo de sofrer. É aí que o amor – esta palavra mágica cantada pelos poetas e prosadores de todos os tempos como faísca electrizante da vida – tem a sua mais elevada expressão.

Em noites luarentas, enquanto o grilo com o seu zumbido estridente irrita o agricultor, rapazes e raparigas, cestos à cabeça, em franca conversa, alicerçam sob bases sólidas o seu futuro lar sem convencionalismos nem enredos caprichosos a entorpecer a beleza do seu sonho...

No conhego remansoso do seu “Lar”, ele, o agricultor em simples e modesta festinha, reúne toda a sua família e expande-se de alegria. E por meses fora, ele renova a sua intensa labuta, com um sorriso franco a bailar nos lábios e um celeiro farto na sua modesta casinha.

Depois de labuta insana e pesada de três meses, a maior parte dos jovens, goza as férias de Setembro na inebriante poesia das suas aldeias. Aproveitamos estes poucos dias em que os livros se espreguiçam languidamente nas pastas e aproximemo-nos com ele que, no esquecimento longínquo da várzea, Grangeia o suficiente para o seu viver e doutros, e ergue preces clamorosas ao Senhor pela bendita dádiva de Setembro.

Agostinho Fernandes - Haverá Vida no Sol?! (1955)

Ainda reinam controvérsias sobre o assunto. Contanto, é um facto mais ou menos assente: há possibilidades de existência de seres vivos no planeta Marte. Nada mais natural. Na verdade, como se pode admitir que de tantas planetas constituintes do sistema solar, de tantos astros conhecidos que pululam pelos espaços, e, de entre inúmeros que nem os mais poderosos aparelhos engendrados pelos cérebros humanos conseguem ver, ou sentir apenas, só o nosso planeta, seja habitado por seres vivos? Até parece um absurdo pensar que essa dádiva seja tão somente monopólio da Terra...

As mentes dos cientistas e investigadores ferveram e lá chegaram à conclusão de que havia possibilidades de vida no Marte... Mas, porque pensaram só no Marte? Com certeza porque é o planeta cujos condições, sob todos os pontos de vista, mais se aproxima das da Terra. Isto está bem se nós pensarmos na existência duma vida semelhante à nossa, mas, os restantes planetas podem ter seres vivos diferentes das no nosso, com outras necessidades, outras exigências...

Já é de todos sabido que os seres vivos tem um grande poder de adaptação. Vejamos o que se passa com esses seres ínfimos que nós chamamos bactérias. Tem a sua temperatura óptima onde proliferam maravilhosamente, mas estas mesmas bactérias podem viver a temperaturas mais altas ou mais baixas, desde que a passagem dum dado grau de calor ao outro seja gradual. Em resumo, acabam por se adaptar. Descobriu-se a penicilina e em voz alta declarou-se uma guerra fatal aos micróbios. A vitória durou pouco. Os nossos minúsculos inimigos tornaram-se resistentes a este prometedor antibiótico, isto é, adaptaram-se a ele...

Se, mesmo dentro do nosso planeta, a natureza dota os seres vivos de tão amplo espectro de adaptação, o que será em relação ao outro?...

O sistema solar é constituído de Mercúrio, Vénus, Terra, Marte, Júpiter, etc, girando todos em volta duma grande fonte calorífica que é o Sol... Alem de outras coisas, o qeu nos leva a duvidar da existência de vida noutros planetas são as largas diferenças de temperatura. Todos os planetas recebem o calor do Sol. É claro que o mais próximo dele receberá mais em relação ao seguinte. Como é que nós avaliamos este calor? Em relação ao calor da Terra. Quando dizemos que Vénus é mais quente, subentendemos que o é em comparação com a Terra. Da mesma forma, o Marte é menos quente.

Na Terra estamos habituados a ver seres que não resistem a um inframinimo e a um determinado inframaximo mas, lá por isso, não podemos dizer que Júpiter onde a temperatura não atinge o nosso mínimo, se no Vénus onde ela é superior a nosso máximo, não haja vida. A única coisa que podemos afirmar é que não pode haver seres vivos iguais aos da Terra.

O que dissemos da temperatura podemos agora generalizar para o resto. Assim, é possível, por mais absurdo que isso pareça, que nos planeta desprovidos de água haja seres vivos que possam viver sem ela, naqueles em que falta ai se viva na absoluta ignorância deste fluido e que na constituição física desta vida entrem elementos que nós ainda não conhecemos ou que não existem na terra e que lhes permitam adaptar ao meio em que vivem...

Quem sabe se há seres no estado líquido, se há seres voláteis ou em qualquer outro estado por nós ignorado?

O que pensarão de nós e do nosso planeta os possíveis habitantes desses mundos? Sabendo que a sua Ciência não excedeu a nossa, o mesmo problema misterioso que é hoje para nós sê-lo-á para eles também... Os seus cientistas devem estar a martelar a cabeça e os aparelhos para responder as perguntas: O “haverá vida noutros planetas?”, “haverá vida na Terra?”

O que dissemos dos planetas podemos prolongar até a miríade de astros, de próprio Sol onde a temperatura atinge cifras inacreditáveis... Quem sabe se no Sol não existem seres no estado gasoso?

Cedo ou tarde chegar-se-á à Lua... e ao Marte. O homem não descansará enquanto não ponha lá o pé... levará consigo tudo o que for preciso para se adaptar àquele meio... Não tardará muito que os demais planetas o tentam também... Também lá chegará...

...E qualquer dia, os nossos descendentes ainda ouvirão, no aeroporto interplanetário, diálogos como este:

- Adeus, querida. Trabalhos urgentes chamam-me a Platão. Espero que não me sejas infiel na ausência...

E a esposa algo comovida:

- Adeus, amado. Boa viagem e feliz regresso...

Ou então terão no jornal em letra minúscula como se fosse uma coisa vulgar... e os simpáticos noivos seguiram viagem ao Sul para lá gozarem a “lua de mel”...

- E lá haverá vida, diferente da nossa, não importa, mas haverá vida no Sol...

Tuesday, 9 July 2013

VS Prabhu - Resposta a AA Bruto da Costa

A próposito do artigo do ilustre co-editor deste jornal Sr. Dr. Carmo Azevedo, sobre as “Castas e classes na sociedade goesa”, vem o Dr. A. A. Bruto da Costa, por quem nutro grande consideração pela coragem e desassombro com que combateu os desmandos e as prepotências durante a ditadura de Salazar, com um artigo “Os Costas e as castas” (30/07/1975). Estou escrevendo em marata uma história de Goa sobre a ditadura de Salazar e é forçoso confessar que o nome do Dr. A. A. Bruto da Costa ocupa um lugar dominante.

O Dr. Bruto da Costa diz que os Costas combateram as castas, mas não diz a que casta pertenceram os Costas. O Dr. Ghurya, eminente historiador e sociólogo indiano, no seu livro “Caste e Class”, diz o seguinte: “Caste is an endogamous group. Endogamy is the summary of caste system. Endogamy is a rule of marriage. It prescribes close in-marriage i.e. marriage within the group. A person of a particular caste or sub-caste. A Brahmin was expected to marry a daughter of a Brahmin and within the Brahmin community; a person of sub-caste for example, a Saraswat was expected to marry a daughter ofa Saraswat. Marriages outside the caste were not only forbidden but also the descendents of such persons were considered casteless and debarred from caste membership”.

Esta é a opinião unânime de todos os historiadores indianos. Ainda Megasthenes, que viveu na Índia na antiguidade, escrevia o mesmo. O Sr. J. J. Da Cunha no seu livro a “Nossa Terra” (Estudos Económicos Financeiros, Sociais e Internacionais). Volume II, p.g. 252, diz que os Costas de Margão são indo-africanos e como não eram puros brâmanes não foram admitidos na Confraria de Deus Espírito Santo de Margão, que era exclusivista. Isso é o que dizem os historiadores.

Vamos agora à sociologia na prática. Diz o Sr. Dr. Bruto da Costa que o seu bisavó, Constâncio Roque da Costa “deixava escrito do próprio punho o seu testamento, datado de 8 de Fevereiro de 1882, em que fazia esta recomendação: “que a sua filha Leopoldina (única nascida até então entre as filhas) devia casar “com pessoa análoga à sua qualidade e a seu contento e SEM ATENÇÃO À CASTA porque não reconheço outra a do MÉRITO e PROBIDADE e reputar-se-á como ingrato qualquer dos meus herdeiros que contestar esta minha paternal disposição”

O que é interessante saber é quantos Costas teriam casado fora da casta “comungando nas ideias” dos seus ascendentes? Não haveria entre membros doutras castas pessoas de “mérito e probidade”, “aptidão”, “talentos e virtudes examplares”! Dizem-me que recentemente (não “nos séculos de ignorância e despotismo”) uma descendente dos Costas quis casar com um chardó “de mérito e probidade” mas houve forte oposição da família e só devido à insistência da rapariga o casamento se realizou! Uma outra descendente dos Costas, que tinha um namoro com um seu companheiro de colégio foi afastada, pelos pais, do rapaz de “talento e virtudes exemplares” só porque este era um “crioulo”.

Diz o sociólogo americano Loland E. Honsiz que na Índia todos os políticos e reformadores sociais proclamam aos quatros ventos que não acreditam nas castas mas quanda chega a hora de dar de casar seu filho ou filha, a primeira coisa que procuram saber é a casta do futuro genro ou nora!

AA Bruto da Costa - Os Costas e as Castas (1975)

Não será, de certo, deslocado que eu venha, a propósito das considerações largamente expendidas neste diário pelo Sr. Dr. Carmo Azevedo, sob a epigrafe “Castas e Classes na Sociedade Goesa”, relembrar factos e atitudes ora ignorados, quando não tenham chegado até os nossos dias desvirtuados ou intencionalmente deformados. Antes pelo contrário, quero crer que, sobre ser oportuno, isso constitui para mim uma obrigação.

Constâncio Roque da Costa, meu bisavô, um dos três primeiros deputados às Cortes, sendo outros dois o nosso patrício Bernardo Peres da Silva e o europeu António José Lima Leitão, antes de embarcar para Lisboa, na charrua “Luconia”, dirigia aos seus concidadãos uma proclamação em que, além do mais, frisava: “a vossa regeneração depende de serem decepados de raiz todos os estabelecimentos feudais, cachopos os mais temíveis contra a igualdade e contra o sagrado direitos do homem, e que deveis aspirar a serdes nivelados em tudo e por tudo aos cidadãos de Portugal.”

“Riscai da vossa memória essa odiosa distinção das castas, puritanismos e outras invenções anti-sociais, filhas do orgulho e ignorância, ficando na inteligência que são estas as fontes reais das vossas desgraças. Esforçai a manter a consideração que as Cortes vos dão, detestando os odiosos nomes de vassalos e colonos, certos de que terão elas muito a peito as vossas prosperidades, como inseparáveis do seu crédito, pois do contrario servir-lhes-á de confusão a vitória, que Portugal alcançou sobre o bruto Adamastor, vitória que faz e fará época gloriosa nos anais da história” (Quadros Históricos de Goa por J.C. Barreto Miranda – Vol. 3, p.g.91 até 92).

Não só tanto. Dados os perigos da viagem e a incerteza do regresso, deixara escrito do próprio punho o seu testamento, datado de 8 de Fevereiro de 1822, em que fazia esta recomendação: que a sua filha Leopoldina (única nascida até então entre as filhas) devia casa “com pessoa análoga à sua qualidade e a seu contento e SEM ATENÇÃO À CASTA, porque não reconheço outra que a do mérito e probidade (as maiúsculas são minhas) e reputar-se-á como ingrato qualquer dos meus herdeiros que contestar esta minha paternal disposição” (Geneaologia da Família Costa de Margão” por Joaquim Bernadino Catão da Costa, p.4)

Projecto de Lei

Comungando nas ideais do pai e plenamente integrado nelas, Bernardo Francisco da Costa, quando deputado às Cortes, apresentava ao Parlamento um projecto de lei tendente a serem riscados dos estabelecimentos píos e outras quaisquer corporações dos estados da Índia todos os artigos que dessem preeminência e exclusivo a alguma casta ou cor, por forma que só o mérito e aptidão para o desempenho fiel das restantes disposições fossem os títulos únicos a exigir dos que nessas associações pretendam entrar. E justificando o mesmo, proferia este discurso:

“Senhores: A carta constitucional, este código, que felizmente é a lei fundamental do estado, não admite entre cidadãos outra distinção que a de seus talentos e virtudes. E não limita os seus benefícios só ao continente do reino mas abriga também debaixo da sua protectora sombra os povos das mais possessões de Portugal.

Contudo nos estados da Índia há confrarias que nos seus estatutos até agora conservam a cláusula de não se aceitar para seus irmãos aqueles que não pertencem a uma determinada casta, embora tenham talentos e virtudes exemplares, manifestamente reconhecidos; e semelhante cláusula, que aí foi introduzida nos séculos da ignorância e despotismo, atravessando incólume os tempos e zombando altiva das ideias do século, ainda hoje é religiosamente cumprida, à vista da autoridade pública que tem imediata inspecção e ingerência nesses estabelecimentos.

...Infelizmente, no templo de Deus, que pregou a igualdade e proclamou a fraternidade, aí mesmo se foi entronizar distinções altamente repugnantes à razão, à lei de Cristo, e à caridade que esses institutos professam. Hasteando a bandeira da união e igualdade universal dos homens, ensinada pelo Deus que morreu por sustentá-la, erigiu-se logo ao pé um monumento a distinções absurdas e divisões repugnantes; e este suplantou aquela!

Hoje que a civilização transpõe todas as barreiras e derruba todos os obstáculos, hoje que as leis dos homens proclamam também a igualdade, é inqualificável a conservação de tais cláusulas, que subsistem apesar mesmo desses povos, que só por obrigados se submetem à maior parte dos regulamentos existentes que desejam reformados.

O absurdo e contra-senso dessas clausulas são tanto mais notáveis, quando fazem parte de instituições pias, cujo fim é a beneficência, a adoração da Divindade, e tanto mais odiosas quanto se praticam no século actual e em frente da letra do vosso código fundamental e da nossa santa religião, que proclamam a fraternidade, a igualdade e a liberadade.”

António Anastásio Bruto da Costa (outro filho de Constâncio Roque da Costa e meu avô, de quem levo o nome) combateu igualmente com vigor toda a discriminação baseada na casta ou na cor, sustentando a igualdade dos cidadãos, igualdade esta garantida pela Carta Constitucional e proclamada, cerca de dois mil anos antes, do alto do Golgotá.

Esforços Baldados

No entanto, todos os esforços empregados para extirpar as diferenças resultantes das castas foram baldados. A proposta apresentada por Bernardo da Costa às Cortes foi remetida para Goa pelo Ministro da Marinha, para sobre ela se pronunciarem as autoridades civis e eclesiásticas.

Ou porque a proposta ou informação do prelado e do governador nunca mais veio ou porque ela foi contrária por razões que não foi dado conhecer, a referida proposta, não obstante a insistência do seu autor, não foi submetida à discussão e aprovação dos Cortes.

Correm anos. Estamos em 1948. D. José da Costa Nunes, Arcebispo de Goa e Patriarca das Índias Orientais, na sua provisão de 12 de Março, informando ter recebido após a sua chegada a Goa, “várias exposições sobre questões de confrarias, privilégios de gãocares e assuntos concomitantes, coisas estas que julgávamos enterradas”, declarava ser de admitir “a constituição de corporações religiosas destinadas somente a determinados grupos sociais”, nomeadamente de brâmanes, chardós e sudras.

Ao tomar conhecimento dessa Provisão, escrevia eu em 9 de mês seguinte a S. Exa. Revma. uma carta manifestando a minha surpresa e o meu desacordo. Depois de acentuar que “tais causas não ressuscitariam e que existiam porque não foram enterradas” dizia:

“Desde os meus verdes anos, venho combatendo distinções castistas. Se elas não são de admitir, e eu não admito, na vida social, muito menos o podem ser nas confrarias, instituições de piedade e culto católico. Compreenderá, portanto, V. Exa., que ninguém mais do que eu aplaude – e com as mãos ambas – a resolução de V. Exa. não deixar “medrar o exclusivismo nas confrarias”. Com igual satisfação, registo a decisão de não consentir no predomínio de “classes fechadas” dentro da Igreja. Mesmo por isso tanto maior é a minha surpresa e mágoa ao verificar que tivesse faltado a necessária força para não contemporizar, “um pouco” que seja, com as tendências locais. É que se tenha consentido que os brâmanes, os chardós, os sudras, os farazes, etc. etc. formem, se quiserem, confrarias privativas!

“To be or not to be, dizia Hamlet. Consentir ou não consentir, eis a questão. Autorizar que se formem “confrarias privativas” sob a base de casta, não acha V. Exa. que é deixar medrar: o exclusivismo nas confrarias? Não será permitir que se salte por cima do espírito da Igreja?”

“Afinal das contas, V. Exa. se limitou a bem pouco: a franquear aos fieis em geral somente a confraria do Santíssimo e isto por os direitos e os privilégios a ela anexados pertenceram “a todos os católicos e não exclusivamente a uma casta ou grupo social”

Confrarias Privativas

O Nobre Prelado respondia-me pela volta do correio, nestes termos:

“Tem alguma razão. Deus sabe a repugância que sente ao transigir com a formação de confrarias privativas, num meio social como o de Goa. Mas alguns párocos asseguraram-me ser este o único meio de resolver a “questão confrarial”, como cá se diz.

“Parece-me, todavia, a availar pelo que chega a meu conhecimento, que esta questão não ficou resolvida. Se me convencer de que a transigência não surtiu o efeito desejado, voltarei ao rigor primitivo.”

“Mas deixe-me desfazer-lhe um certo equívoco: a condenação do exclusivismo não foi determinado por uma questão de castas, mas por haver alguns grupos sociais organizados em confrarias que chamaram exclusivamente a si certos privilégios pertencentes a todos os católicos. Daí a reacção dos excluídos, os quais pretendiam não entrar no grupo, mas conquistar os privilégios monopolizados.

“Ora, desde que se ponha termo a tal monopólio, como se pôs, não há inconvenentes de maior em permitir confrarias privativas, como em toda a parte do mundo são permitidas. Assim, há confrarias ou associações pias de médicos ou advogados, de engenheiros, de agricultores, de carpinteiros, de pescadores, de motoristas, etc.”

Em nova carta fazia significar a S. Exa. Revma. Que uma coisa era a formação de confraria na base profissional e outra na base de castas. E acrescentava: “No primeiro

(Segue na 2a. Página)

caso a diferença que se estabelece é entre duas profissões. Assim, os advogados pertencentes a diferentes castas podem agrupar-se em uma única confraria. No segundo caso, a diferença que se estabelece é entre um individuo e outro individuo, ou seja entre um brâmane, um chardó ou um sudra. Em outras palavras, quer isto dizer que um advogado sudra ou chardó não pode reunir-se numa confraria com um brâmane ou vice versa.”

Não passavam dois meses. Aproveitando a primeira oportunidade que se lhe oferecerem, o ilustre Antíste, num gesto que tanto o dignifica e exalta, reconheceu o seu engano.

Provisões Revogadas

Por circular de 7 de Junho do referido ano, retirava a autorização dada a formação de confraria exclusivistas entre membros de castas e gauncarias, revogando as suas Provisões de 15 de Agosto de 1946 e 12 de Março de 1945.

Justificando a sua nova determinação frisava:

“Só as pessoas de visão acanhada ou os orgulhosos que se julgam infalíveis, se recusam a mudar de parecer e a alterar decisões tomadas.”

“Não fica mal a ninguém modificar a sua opinião, perante os inconvenientes resultantes de medidas anteriormente estabelecidas.”

“Isto vem a propósito do compromisso duma confraria submetida há dias à minha aprovação.”

“Num dos artigos declarava se que só os brâmanes podem fazer parte da confraria. Em abono deste princípio exclusivista, citava-se a minha Circular de 15 de Agosto de 1946. Fui ler a citação. De facto, lá estava, com surpresa minha, a autorização para se fundarem associações pias acentuadamente exclusivistas.”

“Costumando ser lógico no meu pensamento, desta vez falhou a lógica, se considerarmos as inúmeras vezes que condenei o exclusivismo.”

“Sem pretender diminuir a minha incoerência, devo explicar que a permissão para formar confrarias castistas foi como que um enxerto introduzindo no meu pensamento a pedido de alguns, que julgava terminarem assim as “questões confrarias”.

Posso assim dizer afoitamente que fui um dos que levaram o Patriarca Costa Nunes a dar o golpe final no exclusivismo baseado na casta, que predominava nas nossas confrarias.”

Não vá sem ficar dito: o factor ‘casta’, felizmente, por muito tempo, não influiu na politica. Todos gauddés, sudras, brâmanes, chardós, estavam unidos. Constituíam uma força. Uma força sempre pronta a enfrentar, com coragem e dessassombro, os demandos e as prepotências do Poder.

Laxmanrao Sardessai - Aqueles Momentos (1966)

Quero agarrar entre os dedos
Aqueles momentos vagos
Que se esbatem no passado,
Profundo como os seus suspiros,
Vastos como os meus pensamentos,
O rosto da minha mãe moribunda,
Varada por um golpe duma epidemia,
Com a luz baça nos olhos,
A procurar-me.
Era eu então uma criança
De oito anos...
Rolaram hoje cinquenta
Sobre este infortúnio.
A minha memória
Pálida, nublada,
Não pode fixar as linhas
Daquele rosto
Que nunca mais vi,
E aqueles momentos,
Quais pombas minúsculas
Ainda brilham
A distancias infinitas
Na luz dourada!

Walfrido Antão - Telo de Mascarenhas, ou Um Padrão Ocidental na Situação Indiana (1979)

“Mal com os homens por amor à terra; mal com El Rei por amor à terra”

Cada homem tem direito a um sonho ou posto burocrático e não há que assacar culpas à grandeza imensa do Sonho como tal ou a limitação dos mangas-de-alpaca sim senhor El Rei dos Algarves, Yes Sir Milord of Wheat Fields of Punjab, o colonialismo é uma antítese do self-government com todo o seu manto de CORRUPÇÃO. No caso da Burocracia ou do self-employed man de negócios a ascensão ou declínio depende de um certo numero de constantes entre os quais conta a habildade de adorar o sol nascente e a intriga palaciana o problema do sonho é um caso diferente. O sonho de um homem letrado afasta-o das massas como numa contradição infeliz, essas mesmas massas humanas em cujo benefício o sonho visita o Homem. Tal foi o caso trágico do sonho de Telo de Mascarenhas. Nascido na aldeia de Velção, quase meu coaldeano, o Dr. Telo de Mascaranhas teve de ir a Coimbra como escolar de Direito para reconhecer as suas raízes indianas e juntamente com Adeodato Barreto, o grande e infeliz poeta que morreu até a consumação do ideário marxista numa aldeia de Portugal, com José Paulo Teles e outros (conforme leio num dos exemplares da “Índia Nova”) fundou o Instituto Indiano anexo a Biblioteca da Faculdade de Letras. Eram os anos 1920, a literatura portuguesa dividia-se entre o Surrrealismo de Almada Negreiros e a poesia épica decantada no ocultismo de Fernando Pessoa ou a trágico desespero de Mário de Sá Carneiro. O liberalismo democrático de António José de Almeida vivia horas de agonia e o MONGE de Coimbra preparava-se para tomar de assalto a velha Lisboa das naus que tinham vindo à Índia e marinheiros de Alfama. A longa noite da Ditadura com seus mitos glorificadores do Imperador Máximo de Aquém e Além Mar ia espalhando seu véu de sombras por sobre esse tão belo povo português, um povo capaz de uma cultura humanista como provam António Sérgio e Jaime Cortesão. Não se ouve falar mais do Instituto Indiano em Coimbra. “A Índia Nova” que chega a publicar uma mensagem de Tagore vê os seus redactores já formados e com família bem portuguesa. Adeodato Barreto recusa-se a burocratizar o pensamento em tacho oportunista que lhe podia dar pão e vinho e mantém-se firme a um ideário de redenção económica que lhe nega suficientes para se tratar e tratar dos seus, morrendo quase em penúria. São dos anos 1940 algumas traduções de obras de Tagore que aparecem em Lisboa da lavra de Telo Mascarenhas e que, muito embora venham via língua francesa, constituem uma bela introdução da alma indiana ao povo português. Anos 1949 e Telo Mascarenhas surge-nos aqui em casa fresco de Lisboa e Porto para convidar meu pai que ao tempo era presidente da câmara de Mormugão para presidir uma conferência no Casino de Vasco da Gama sobre “Primavera e os Poetas de Amor”, conferência esta que não se chegou a realizar por a polícia portuguesa ter cheirado o indianismo do autor. Tinha eu 13 anos de idade e admirava-o de improvisar versos às flores, às plantas, ao palmeiral tudo com invocações aos deuses indianos. É um poeta, pensava eu e por lá o teria esquecido, quando embrulhado entre revistas femininas de Bombaim começou a enviar-nos cópias do “Ressurge, Goa” do exílio. Há idealismo na sua Invocação quando rezava alto “edificaremos sobre o mar, sobre a terra, sobre as estrelas, a glória da nossa Terra Imortal”. Quem poderá negar que ele amava Goa?

Poeta do campestre, do rural como se diria agora, com profundas influências de Gil Vicente e Rodrigues Lobo, Telo de Mascarenhas provou-se um misfit, quem sabe um inconveniente que não sabia Konkani e Marata aos grupos políticos de Bombaim que trabalhavam pela libertação de Goa.

A política indiana não é para poetas ou idealistas e o exemplo mártir de um Tristão Bragança Cunha ou um Jaypracasha Narain (a este claram o grito de Revolução total com uma bolsa de um crore de rupias) chega-nos para não alimentarmos quaisquer dúvidas a este respeito. No caso de Tristão Bragança Cunha e tantos outros heróis esquecidos como Polly da Silva que foi a morrer aos 30 e poucos anos num curral basta-nos o facto de o Sonho de alguns ter sobejado para os mineiros, em especial uma família, continuarem a gozar do Poder. Uns sofreram para os mineiros continuarem a gozar os privilégios.

Como disse atrás, o Sonho de um homem letrado afasta-o das massas. No caso de Telo de Mascarenhas que depois de sofrer dez longos anos de prisão havia tentado entrar na politica, o resultado foi constrangedor. As massas não vão pelos sacrifícios, vão sim pelos símbolos comunalistas, daí a tragédia da democracia dos analfabetos com seu corolário de self-government is always better than alien rule. É ainda cedo demais para se pronunciar sobre a validade de um sonho, só a História poderá abarcar o Juízo final. Entretanto fica-nos a morte de um homem de letras portuguesas, um cativo do teatro vincentino e um devoto nem sempre regular das canções de escárnio e mal-dizer de que nos deu provas no Ressurge Goa dos anos de exílio.

Amigo da minha família, Telo de Mascarenhas impôs-se-me sobretudo pelo amor à Terra regado com anos de cárcere no exílio. Pena foi que educado mentalmente nos padrões da cultura jurídica do mundo latino não pudesse ajustar-se ao calão da Terra de que tanto se orgulhava. Dele se podia dizer “mal com os homens por amor à Terra, mal com El-Rei por amor à Terra”.

Como homem de Letras, Telo de Mascarenhas merece ser notado como poeta da tradição vicentina, das canções de escárnio e mal-dizer, um improvisador à velha moda portuguesa das desgarradas, um antigo que não chegou a alcançar os movimentos modernos da poesia e prosa portuguesa. Sendo assim, um poeta da língua lusa, era natural que até o sonho do Nacionalismo ficasse a mercê de suspeição e dúvida porque o local só aceita, porque compreende, unicamente o que se lhe diga em vernáculo ou no colonial mas ganha-pão inglês.

Curvando-nos reverentes perante a grandeza do sonho que permitiu aos Capitalistas maior mobilização de Depósitos e Investimentos em construções, alta de preços de terrenos e melhores facilidades de ensino para os filhos de mães goesas embora com um self-government corrupto, pedimos a Higher Power que nos tolha a mão antes de atirarmos a primeira acusação de Telo de Mascarenhas a paz do silêncio e da verdade junto da campa do grande esquecido Nascimento Mendonça.