O homem
Uma vez
Quis sondar
O fundo do mar
Do vinho, da embriaguez
E…
Lentamente
Foi perdendo
A sapiência
A dignidade
A noção da vida
E do homem
Que é que ficou?
Ficou um cadaver
A boiar
À superfície do mar
Um homem
Sem humanidade.
Thursday, 31 March 2011
Wednesday, 30 March 2011
Augusto do Rosário Rodrigues - Canalha de Gravata (1965)
Há escória de toda a qualidade
Escória que pulula nas aldeias,
Escória que vagueia nas cidades,
Escória que eu receio e tu receias.
É difícil saber a sua idade,
Rostos ferozes de túmidas veias,
Heróis do cinismo e da maldade
Semeando homicídios, a mãos cheias.
Bêbados, prostitutas e mendigos,
Envergando farrapos já antigos,
O lodo indesejável – a sucata...
Tudo isto, mesmo assim, é nobre e digno
Pois infinitamente mais maligno
Escória que pulula nas aldeias,
Escória que vagueia nas cidades,
Escória que eu receio e tu receias.
É difícil saber a sua idade,
Rostos ferozes de túmidas veias,
Heróis do cinismo e da maldade
Semeando homicídios, a mãos cheias.
Bêbados, prostitutas e mendigos,
Envergando farrapos já antigos,
O lodo indesejável – a sucata...
Tudo isto, mesmo assim, é nobre e digno
Pois infinitamente mais maligno
É o canalha vil que usa gravata!
Tuesday, 29 March 2011
Laxmanrao Sardessai - Zalach Pahije (1965)
Se Deus é do mundo o pai,
Desta terra o é Nath Pai
Porque nos ensinou a pronunciar
“Zalach Pahije”!
Deus, antes da criação,
Pronunciou “Fiat Lux”
Mas, após a eleição,
Vassantrao Naik
“Zalach Pahije”!
Deus guia o Universo inteiro
Para a salvação
E Esvantrao Chavan
Esta mimosa terra
Para a perdição
Com o seu mantra
“Zalach Pahije”!
Sou um ignorante
Mas, em vez de instrução,
Sempre me impingem
“Zalach Pahije”!
Sou um indigente
E persegue-me a fome.
Mas dão-me, volta e meia,
“Zalach Pahije”!
Sou um enfermo
E sofro de malaria,
Mas ministram-me,
Dia e noite doses
de “Zalach Pahije”!
Sou um manducar
E para ser batcar –
Dizem – devo rezar
“Zalach Pahije”!
Sou um eleitor
E prometem-me
O paraíso inteiro
Contanto que diga
Sem cessar,
“Zalach Pahije”!
Sou um mestre-escola
Mas forçado – sina minha! –
A ensinar
A crianças inocentes
“Zalach Pahije”!
Na nossa aldeia
Quem não tem ocupação
E nos negócios alheios
Mete o seu bedelho,
É conhecido como
“Zalach Pahije”!
Aparece nos templos
E nas escolas e nos bazares,
A ódiosa coruja
De “Zalach Pahije”!
À maneira de fantasma
Que persegue a sua vítima,
Persegue em toda a parte
O goês inocente
O fantasma
De “Zalach Pahije”!
Tem entrada
Em todos os círculos
Quem possiu
O santo e senha
De “Zalach Pahije”!
Suga o sangue
do pacato cidadão
A sanguessuga nojenta
De “Zalach Pahije”!
Do coração soturno
Do falido “M.G.”
Sai o ronco mugido
De “Zalach Pahije”!
O álcool de alto grau
Faz ao embriagado
Vomitar bílis
Contra quem quer.
Assim tem sido
O “Zalach Pahije”!
Desvirtua e desonra,
Abandalha e corrompe
O slogan assolador
De “Zalach Pahije”!
Conflitos na família,
Conflitos na sociedade,
Conflitos com os amigos,
Conflitos com os vizinhos,
A raiz de todos eles
Está no “Zalach Pahije”!
O fantasma hediondo
Que profana a dignidade,
Vilipendia o amor,
Cospe no passado
E adultera o futuro
É “Zalach Pahije”!
Desta terra o é Nath Pai
Porque nos ensinou a pronunciar
“Zalach Pahije”!
Deus, antes da criação,
Pronunciou “Fiat Lux”
Mas, após a eleição,
Vassantrao Naik
“Zalach Pahije”!
Deus guia o Universo inteiro
Para a salvação
E Esvantrao Chavan
Esta mimosa terra
Para a perdição
Com o seu mantra
“Zalach Pahije”!
Sou um ignorante
Mas, em vez de instrução,
Sempre me impingem
“Zalach Pahije”!
Sou um indigente
E persegue-me a fome.
Mas dão-me, volta e meia,
“Zalach Pahije”!
Sou um enfermo
E sofro de malaria,
Mas ministram-me,
Dia e noite doses
de “Zalach Pahije”!
Sou um manducar
E para ser batcar –
Dizem – devo rezar
“Zalach Pahije”!
Sou um eleitor
E prometem-me
O paraíso inteiro
Contanto que diga
Sem cessar,
“Zalach Pahije”!
Sou um mestre-escola
Mas forçado – sina minha! –
A ensinar
A crianças inocentes
“Zalach Pahije”!
Na nossa aldeia
Quem não tem ocupação
E nos negócios alheios
Mete o seu bedelho,
É conhecido como
“Zalach Pahije”!
Aparece nos templos
E nas escolas e nos bazares,
A ódiosa coruja
De “Zalach Pahije”!
À maneira de fantasma
Que persegue a sua vítima,
Persegue em toda a parte
O goês inocente
O fantasma
De “Zalach Pahije”!
Tem entrada
Em todos os círculos
Quem possiu
O santo e senha
De “Zalach Pahije”!
Suga o sangue
do pacato cidadão
A sanguessuga nojenta
De “Zalach Pahije”!
Do coração soturno
Do falido “M.G.”
Sai o ronco mugido
De “Zalach Pahije”!
O álcool de alto grau
Faz ao embriagado
Vomitar bílis
Contra quem quer.
Assim tem sido
O “Zalach Pahije”!
Desvirtua e desonra,
Abandalha e corrompe
O slogan assolador
De “Zalach Pahije”!
Conflitos na família,
Conflitos na sociedade,
Conflitos com os amigos,
Conflitos com os vizinhos,
A raiz de todos eles
Está no “Zalach Pahije”!
O fantasma hediondo
Que profana a dignidade,
Vilipendia o amor,
Cospe no passado
E adultera o futuro
É “Zalach Pahije”!
Se, ó goês, queres
Viver em paz e harmonia
Repele quanto antes
A ignominia fatal
De “Zalach Pahije”!
Levanta-te e trabalha
E não está longe o dia
Em que volte
Para a terra de origem
A peste maldita
De “Zalach Pahije”.
Viver em paz e harmonia
Repele quanto antes
A ignominia fatal
De “Zalach Pahije”!
Levanta-te e trabalha
E não está longe o dia
Em que volte
Para a terra de origem
A peste maldita
De “Zalach Pahije”.
Friday, 25 March 2011
RV Pandit - Sem Amparo (1968)
A cera da colmeia
Derrete e arde
Molda e se adapta
E o mel abarca
Mas é doce o mel
E não a cera
A cera
Não tem sabor
O que dá luz
Com o auxílio da cera
É o pavio
E não a cera
A cera é diferente
Do mel e do pavio
Assim é a minha mente
A minha mente
Pode abarcar o mel
Mas não pode tornar-se doce
A minha mente
Pode dar auxílio
Ao pávio para dar luz
Mas, ardendo-se
Não pode dar um exemplo
Do sacríficio
Da auto-imolação
Assim a minha mente
Derrete e arde
Com o amparo
Dos outros
Mas sem o amparo
Ela deixa de derreter
De arder
E torna a ser
Outra vez
Fria e dura
Assim é a minha mente!
Derrete e arde
Molda e se adapta
E o mel abarca
Mas é doce o mel
E não a cera
A cera
Não tem sabor
O que dá luz
Com o auxílio da cera
É o pavio
E não a cera
A cera é diferente
Do mel e do pavio
Assim é a minha mente
A minha mente
Pode abarcar o mel
Mas não pode tornar-se doce
A minha mente
Pode dar auxílio
Ao pávio para dar luz
Mas, ardendo-se
Não pode dar um exemplo
Do sacríficio
Da auto-imolação
Assim a minha mente
Derrete e arde
Com o amparo
Dos outros
Mas sem o amparo
Ela deixa de derreter
De arder
E torna a ser
Outra vez
Fria e dura
Assim é a minha mente!
Monday, 21 March 2011
Alberto de Menezes Rodrigues - S. Estanislau (1965)
Ali, no cantinho, alvejam mogarins
Vamos ao pé deles.
Não sentes a fragrancia inebriante
Que eles rescendem?
São de beleza fascinante
Estas flores de Goa!
Ouve: ó donzela:
No dia das tuas núpcias
Levarás na mão
Um ramo de mogarins.
E se então florescer aquela laranjeira,
Que se ergue sobranceira
Ao pé do poço,
Ataviar-te-ás
Com uma grinalda de suas flores,
Sorriste! Sorriste afinal!
Mas há mais. Escuta. Usarás um sari
De brancura lirial!
O sari é um traje lindo.
Nas suas dobras, curvas e voltas,
No frufru que ele produz,
Há algo que encanta e fascina,
Nunca viste, em Agosto ou Setembro,
Ao sol poente
(Por ocasião de uma festividade),
Mulheres Indus
Seguiram em grupos,
Por caminhos rurais,
Para casas de seus parentes ou amigos?
A essa hora vespertina,
O verde dos arrozais
Que bem realça a graça dos saris!
Vamos ao pé deles.
Não sentes a fragrancia inebriante
Que eles rescendem?
São de beleza fascinante
Estas flores de Goa!
Ouve: ó donzela:
No dia das tuas núpcias
Levarás na mão
Um ramo de mogarins.
E se então florescer aquela laranjeira,
Que se ergue sobranceira
Ao pé do poço,
Ataviar-te-ás
Com uma grinalda de suas flores,
Sorriste! Sorriste afinal!
Mas há mais. Escuta. Usarás um sari
De brancura lirial!
O sari é um traje lindo.
Nas suas dobras, curvas e voltas,
No frufru que ele produz,
Há algo que encanta e fascina,
Nunca viste, em Agosto ou Setembro,
Ao sol poente
(Por ocasião de uma festividade),
Mulheres Indus
Seguiram em grupos,
Por caminhos rurais,
Para casas de seus parentes ou amigos?
A essa hora vespertina,
O verde dos arrozais
Que bem realça a graça dos saris!
Thursday, 17 March 2011
Telo de Mascarenhas - O Nosso Passado Político (1952)
Não obstante termos desempenhado várias funções oficiais na Metrópole e termos vivido durante um longo período em Portugal, nunca renegamos o nosso ideal nacionalista e nunca fizemos segredo das nossas ideais.
O ideal nacionalista nasceu em nós, num grupo de goeses que faziam os seus estudos em Portugal, mercê do conhecimento da História da Índia e da nossa própria história, das nossas tradições e do nosso glorioso passado. Em Goa tinham-nos ensinado a História de Portugal, como sendo a nossa História e a venerar os reais guerreiros e os “heróis” portugueses. Em Portugal, porém libertamo-nos dessas falsas ideias e dos ídolos alheios, e aprendemos a amar a Índia e os seus grandes vultos, do passado e do presente – o Rei Açoca, Pritiviraj, Sivaji Tagore e Gandhi.
Só se ama melhor a nossa terra quando estamos longe dela. E nós amamo-la e cultivamo-la com um sentimento misto de devoção e orgulho. Durante as férias escolares, em Portugal, quando não nos embrenhávamos nas magníficas matas de Sintra ou Bucaço ou quando não repousávamos nas areias douradas, que são as praias de Portugal, refugiávamo-nos na Biblioteca Nacional de Lisboa, onde nós familiarizámos com o multimilionário repositório dos Hinos de Harivança, com as obras dos historiadores que nos falavam da Índia, tais como as de Max Muller, Gustave Le Bon, Jacoilliot, obras que nos deslumbravam, e com as dos nossos próprios escritores como Francisco Luís Gomes. Foram eles os iniciadores do nosso nacionalismo. Em 1923, Romain Rolland publicava, em tradução francesa, os escritos e as cartas de Mahatma Gandhi, com o título de “La Jeune Inde”, que para nós foi um deslumbramento e a revelação da alma do nosso maior Apóstolo do Nacionalismo Indiano. Levados pelo nosso ardor nacionalista, fundávamos em Lisboa, em 27 de Janeiro de 1926, o Centro Nacionalista Hindu, em cuja sessão inaugural foi saudada a Índia com discursos inflamados de puro patriotismo, que o “Bharat” de Hegdó Dessai publicou em número especial. Dos iniciadores deste movimeno só um, infelizmente, se encontra entre nós lutando pelo nosso velho ideal – o Dr. António Furtado. O artigo que nessa altura publicámos no “Bharat” intitulado “A Morte dos Ídolos” foi o primeiro grito de rebelião contra os falsos ídolos que haviam imposto à Nossa Terra e às nossas almas, com o fim de extirpar delas a nossa qualidade de indianos. E este primeiro acto de rebelião deu lugar a uma violenta reacção por parte das autoridades imperialistas de Goa, secundadas por alguns goeses, que arrastaram o “Bharat” à barra do tribunal como responsável pela publicação daquele nosso artigo.
Seguiu-se depois em Coimbra, em 1927, a era de renovação literária com fundo sentido nacionalista com o jornal “Índia Nova” (Órgão dos Estudantes Goeses das Universidades de Portugal) e do qual foi alma dinâmica, entre outros, o malogrado Adeodato Barreto.
Este nosso velho idealismo não quebramos através de anos, bem pelo contrário, manteve-se sempre aceso a ponto de nos ter dado forças e alento para abandonando a nossa vida profissional em Portugal, regressarmos à Índia e nos lançarmos nesta “mêlée” feita de incertezas, de renúncia e de sacrifícios, que é a luta pela emancipação da Nossa Terra, porque achamos que era do nosso dever, e dos mais sagrados, ser coerentes com nossas ideiais. E a quem luta sem ambições, com o único intuito de ver realizado um nobre ideal, a Providência não abandona. E o nosso olho da Providência é a obra a que lançamos ombros com trabalhos insanos e sacrifícios sem conta – o “Ressurge, Goa!” – alimentado com o melhor do nosso esforço com o sangue arrancado do nosso próprio peito, como os pelicanos, e mercê disso ele tem hoje uma larga expansão e é tido como uma nova aurora anunciadora da breve redenção do Povo Goês.
O ideal nacionalista nasceu em nós, num grupo de goeses que faziam os seus estudos em Portugal, mercê do conhecimento da História da Índia e da nossa própria história, das nossas tradições e do nosso glorioso passado. Em Goa tinham-nos ensinado a História de Portugal, como sendo a nossa História e a venerar os reais guerreiros e os “heróis” portugueses. Em Portugal, porém libertamo-nos dessas falsas ideias e dos ídolos alheios, e aprendemos a amar a Índia e os seus grandes vultos, do passado e do presente – o Rei Açoca, Pritiviraj, Sivaji Tagore e Gandhi.
Só se ama melhor a nossa terra quando estamos longe dela. E nós amamo-la e cultivamo-la com um sentimento misto de devoção e orgulho. Durante as férias escolares, em Portugal, quando não nos embrenhávamos nas magníficas matas de Sintra ou Bucaço ou quando não repousávamos nas areias douradas, que são as praias de Portugal, refugiávamo-nos na Biblioteca Nacional de Lisboa, onde nós familiarizámos com o multimilionário repositório dos Hinos de Harivança, com as obras dos historiadores que nos falavam da Índia, tais como as de Max Muller, Gustave Le Bon, Jacoilliot, obras que nos deslumbravam, e com as dos nossos próprios escritores como Francisco Luís Gomes. Foram eles os iniciadores do nosso nacionalismo. Em 1923, Romain Rolland publicava, em tradução francesa, os escritos e as cartas de Mahatma Gandhi, com o título de “La Jeune Inde”, que para nós foi um deslumbramento e a revelação da alma do nosso maior Apóstolo do Nacionalismo Indiano. Levados pelo nosso ardor nacionalista, fundávamos em Lisboa, em 27 de Janeiro de 1926, o Centro Nacionalista Hindu, em cuja sessão inaugural foi saudada a Índia com discursos inflamados de puro patriotismo, que o “Bharat” de Hegdó Dessai publicou em número especial. Dos iniciadores deste movimeno só um, infelizmente, se encontra entre nós lutando pelo nosso velho ideal – o Dr. António Furtado. O artigo que nessa altura publicámos no “Bharat” intitulado “A Morte dos Ídolos” foi o primeiro grito de rebelião contra os falsos ídolos que haviam imposto à Nossa Terra e às nossas almas, com o fim de extirpar delas a nossa qualidade de indianos. E este primeiro acto de rebelião deu lugar a uma violenta reacção por parte das autoridades imperialistas de Goa, secundadas por alguns goeses, que arrastaram o “Bharat” à barra do tribunal como responsável pela publicação daquele nosso artigo.
Seguiu-se depois em Coimbra, em 1927, a era de renovação literária com fundo sentido nacionalista com o jornal “Índia Nova” (Órgão dos Estudantes Goeses das Universidades de Portugal) e do qual foi alma dinâmica, entre outros, o malogrado Adeodato Barreto.
Este nosso velho idealismo não quebramos através de anos, bem pelo contrário, manteve-se sempre aceso a ponto de nos ter dado forças e alento para abandonando a nossa vida profissional em Portugal, regressarmos à Índia e nos lançarmos nesta “mêlée” feita de incertezas, de renúncia e de sacrifícios, que é a luta pela emancipação da Nossa Terra, porque achamos que era do nosso dever, e dos mais sagrados, ser coerentes com nossas ideiais. E a quem luta sem ambições, com o único intuito de ver realizado um nobre ideal, a Providência não abandona. E o nosso olho da Providência é a obra a que lançamos ombros com trabalhos insanos e sacrifícios sem conta – o “Ressurge, Goa!” – alimentado com o melhor do nosso esforço com o sangue arrancado do nosso próprio peito, como os pelicanos, e mercê disso ele tem hoje uma larga expansão e é tido como uma nova aurora anunciadora da breve redenção do Povo Goês.
Tuesday, 15 March 2011
Augusto do Rosário Rodrigues - Ressurgir (1982)
Mil novecentos quarenta e sete – eis uma data
Desde a qual a Nação frui liberdade lata
Vertido um mar de sangue, o inglês finalmente
Promete deixar Índia em paz, de boa mente...
Foi em quatorze de Agosto! Um dia a mais raiara;
Batera a meia noite. O Bharat trepidava...
Sonhos de glória e raiva! Euforia! Tristeza
Um povo que traçou páginas de beleza
Vibrava em alto grau, tanto no Parlamento
Como fora na rua, à luz de firmamento...
E um homem austero, a passo mesurado,
Caminhou então, hirto e solene, ao estrado...
Era o audaz Nehru, o primeiro-ministro.
Acabara o terror, o regime sinistro.
Uma terra já livre – ia ter finalmente
Um governo só seu, mesmo da sua gente!
Cumprido o protocolo e aposta a chancela
Um dilúvio de luz – visão de Cinderela –
Inunda o capital! As ruas, as esquinas.
Eram grandes florões de cores peregrinas.
Archotes, lampiões, como em dias de festa,
Brilhavam no solar e na casa modesta.
Bandeiras e festões, mil ramos de verdura;
Charangas a tocar; fogos, doces, fartura!
Homens, ao desafio, choravam a gritar
No entretanto, Nehru, numa voz muito calma,
Entrava a declamar, bem do âmago da alma
Sua fala à Nação, mensagem bem sentida
O eco passional duma alma dolorida:
Um sulco de agra dor riscava-lhe a fronte:
Como num sonho mau, ele via defronte
Questões de águas do mar e questões dos caminhos,
A intriga de Jinah, receios dos vizinhos...
Uma Índia bipartida, ele já visionava
Um mal bem fatal que de longe espreitava...
Tudo isto e muito mais, nessa data bendita
Passou, qual raio veloz, na mente do Pandita,
Que cimentou com sangue e mais inteligência
O último grau de nossa Independência.
Desde a qual a Nação frui liberdade lata
Vertido um mar de sangue, o inglês finalmente
Promete deixar Índia em paz, de boa mente...
Foi em quatorze de Agosto! Um dia a mais raiara;
Batera a meia noite. O Bharat trepidava...
Sonhos de glória e raiva! Euforia! Tristeza
Um povo que traçou páginas de beleza
Vibrava em alto grau, tanto no Parlamento
Como fora na rua, à luz de firmamento...
E um homem austero, a passo mesurado,
Caminhou então, hirto e solene, ao estrado...
Era o audaz Nehru, o primeiro-ministro.
Acabara o terror, o regime sinistro.
Uma terra já livre – ia ter finalmente
Um governo só seu, mesmo da sua gente!
Cumprido o protocolo e aposta a chancela
Um dilúvio de luz – visão de Cinderela –
Inunda o capital! As ruas, as esquinas.
Eram grandes florões de cores peregrinas.
Archotes, lampiões, como em dias de festa,
Brilhavam no solar e na casa modesta.
Bandeiras e festões, mil ramos de verdura;
Charangas a tocar; fogos, doces, fartura!
Homens, ao desafio, choravam a gritar
No entretanto, Nehru, numa voz muito calma,
Entrava a declamar, bem do âmago da alma
Sua fala à Nação, mensagem bem sentida
O eco passional duma alma dolorida:
Um sulco de agra dor riscava-lhe a fronte:
Como num sonho mau, ele via defronte
Questões de águas do mar e questões dos caminhos,
A intriga de Jinah, receios dos vizinhos...
Uma Índia bipartida, ele já visionava
Um mal bem fatal que de longe espreitava...
Tudo isto e muito mais, nessa data bendita
Passou, qual raio veloz, na mente do Pandita,
Que cimentou com sangue e mais inteligência
O último grau de nossa Independência.
Monday, 14 March 2011
Alberto de Menezes Rodrigues - Insónia (1970)
Foge-me o sono. A noite avança,
Negra como o carvão.
Cães ladram na vizinhança,
Fere-me os ouvidos
A estridulação
Dos grilos
Um dia morreu e um novo nasceu
Canta um galo
Amanheceu
Negra como o carvão.
Cães ladram na vizinhança,
Fere-me os ouvidos
A estridulação
Dos grilos
Um dia morreu e um novo nasceu
Canta um galo
Amanheceu
Tuesday, 8 March 2011
Francisco Correia-Afonso - Sorrowing Lies My Land (1962)
O leitor duma novela da vida e costumes de Goa com este título devia a cada página ouvir o tanger de plangentes sinos, o choro de carpideiras. Mas não. Lambert Mascarenhas, seu autor, tem o estilo ligeiro e cantante e, nas suas evocações da nossa vida rural, dos nossos simples costumes, palpita o amor pela terra e pelo povo. Quão diferente é este ambiente do ambiente pincelado por Orlando da Costa – este todo artificial, certamente composto com arte e jeito, mas desgostosamente afastado das realidades do clima e relações sociais, ao passo que o livro de Lambert Mascarenhas corre espontâneo e natural, como uma fonte que brotou do flanco dum oiteiro coberto de surungam e pidkallam.
Lambert Mascarenhas vive a vida que narra, sente os sentimentos que possuem os seus personagens. Durante a sua longa ausência em Bombaim sentiu a saudade do cheiro das nossas flores, do saber acre da água do mar durante as alegres passeatas na praia de Colvá, sua aldeia natal. São reais e vivos estes personagens – o Pai lavrador, amando a sua várzea e o seu palmar, mas homem à sua maneira culto, a Mãe caseira com fortes opiniões sobre a educação dos seus filhos, os rapazes e as meninas cada qual com o seu temperamento e os seus gostos mas correndo por todo este aglomerado de temperamentos e de gostos qualquer elemento comum que é tipicamente goês desenrolando-se na atmosfera confinada da aldeia – para os rapazes a escola primária, o liceu e depois fuga para Bombaim ou as Áfricas, para as meninas o casamento...
Mas porque jaz triste a terra de Lambert?
O episódio passa-se durante os últimos terríveis anos do regime policial em Goa. Descreve-se a primeira incursão, na nossa pacata terra, duma força expedicionária de paclés. Correm pelas aldeias histórias aflitivas de lares invadidos, de raparigas violadas. O regedor da aldeia defende os paclés e faz o elogio “da civilização” de que eles são os portadores para afinal cair sucumbido sob a terrível notícia de a filha ter sido raptada e violada.
Descreve-se a fortes traços a resistência do povo no dia em que Tristão Bragança Cunha desafiou a lei na praça de Margão. O Pai, tenaz anti-salazarista, toma parte na luta e regressa à casa com um rasgão na cara. Dias depois é chamado ao quartel onde o comissário lhe fez um “sermão” narrando factos íntimos da sua vida. O bom velho fica sabendo no fim que o seu próprio filho o delatou à policia. Este rapaz, filho desnaturado, é o símbolo de tantos que traíram a sua terra Mãe recebendo pinguemente pagos lugares para fazerem o frete do portuguesismo. O velho simboliza o espírito de resistência e de luta dos goeses cultos e patrióticos, em face de todos os sofrimentos físicos e morais.
Neste breve período encontraremos as razões por que jaz triste a terra de Lambert.
Este livro encantador produzido por Lambert Mascarenhas em terra ao tempo estrangeira e no período em que viveu ali exilado, chegou ao seu pátrio lar no encalço das tropas indianas libertadoras. É ainda cedo para Lambert Mascarenhas escrever a sequência do seu lindo romance. Mas fazemos votos para que chegue a produzi-lo. Poderíamos sugerir-lhe vários títulos: “As nuvens negras levantam-se”, “Voltou o sorriso ao rosto da minha Goa”...
Mas Lambert Mascarenhas é artista bastante para achar um título muito mais bonito que oxalá possa ser um título assinalado uma feliz verdade.
Lambert Mascarenhas vive a vida que narra, sente os sentimentos que possuem os seus personagens. Durante a sua longa ausência em Bombaim sentiu a saudade do cheiro das nossas flores, do saber acre da água do mar durante as alegres passeatas na praia de Colvá, sua aldeia natal. São reais e vivos estes personagens – o Pai lavrador, amando a sua várzea e o seu palmar, mas homem à sua maneira culto, a Mãe caseira com fortes opiniões sobre a educação dos seus filhos, os rapazes e as meninas cada qual com o seu temperamento e os seus gostos mas correndo por todo este aglomerado de temperamentos e de gostos qualquer elemento comum que é tipicamente goês desenrolando-se na atmosfera confinada da aldeia – para os rapazes a escola primária, o liceu e depois fuga para Bombaim ou as Áfricas, para as meninas o casamento...
Mas porque jaz triste a terra de Lambert?
O episódio passa-se durante os últimos terríveis anos do regime policial em Goa. Descreve-se a primeira incursão, na nossa pacata terra, duma força expedicionária de paclés. Correm pelas aldeias histórias aflitivas de lares invadidos, de raparigas violadas. O regedor da aldeia defende os paclés e faz o elogio “da civilização” de que eles são os portadores para afinal cair sucumbido sob a terrível notícia de a filha ter sido raptada e violada.
Descreve-se a fortes traços a resistência do povo no dia em que Tristão Bragança Cunha desafiou a lei na praça de Margão. O Pai, tenaz anti-salazarista, toma parte na luta e regressa à casa com um rasgão na cara. Dias depois é chamado ao quartel onde o comissário lhe fez um “sermão” narrando factos íntimos da sua vida. O bom velho fica sabendo no fim que o seu próprio filho o delatou à policia. Este rapaz, filho desnaturado, é o símbolo de tantos que traíram a sua terra Mãe recebendo pinguemente pagos lugares para fazerem o frete do portuguesismo. O velho simboliza o espírito de resistência e de luta dos goeses cultos e patrióticos, em face de todos os sofrimentos físicos e morais.
Neste breve período encontraremos as razões por que jaz triste a terra de Lambert.
Este livro encantador produzido por Lambert Mascarenhas em terra ao tempo estrangeira e no período em que viveu ali exilado, chegou ao seu pátrio lar no encalço das tropas indianas libertadoras. É ainda cedo para Lambert Mascarenhas escrever a sequência do seu lindo romance. Mas fazemos votos para que chegue a produzi-lo. Poderíamos sugerir-lhe vários títulos: “As nuvens negras levantam-se”, “Voltou o sorriso ao rosto da minha Goa”...
Mas Lambert Mascarenhas é artista bastante para achar um título muito mais bonito que oxalá possa ser um título assinalado uma feliz verdade.
Monday, 7 March 2011
Maria Elsa da Rocha - Não Tens Personalidade? (1963)
Não tens personalidade?
Com esse teu ar singelo e reservado
De homem educado
Que na multidão de gentes,
Alias do mesmo subcontinente,
Te faz ficar só,
Embora contente,
Fruindo duma forma peculiar
Esse momento vital?
Não tens personalidade?
Quando ris e choras
Nesse mandó dolente,
Qual beijo suave
Do Ocidente com o Oriente,
Numa simbiose de sons
Que evocam teu Passado
De machilas e boiâs,
Palanquins opalescentes?
Não tens personalidade?
No olhar firme
Do homem comum
Que calmo enfrenta
Monções irregulares
Na certeza absoluta de haver pão..
Para outro dia tão igual...
Com esse teu ar singelo e reservado
De homem educado
Que na multidão de gentes,
Alias do mesmo subcontinente,
Te faz ficar só,
Embora contente,
Fruindo duma forma peculiar
Esse momento vital?
Não tens personalidade?
Quando ris e choras
Nesse mandó dolente,
Qual beijo suave
Do Ocidente com o Oriente,
Numa simbiose de sons
Que evocam teu Passado
De machilas e boiâs,
Palanquins opalescentes?
Não tens personalidade?
No olhar firme
Do homem comum
Que calmo enfrenta
Monções irregulares
Na certeza absoluta de haver pão..
Para outro dia tão igual...
Sunday, 6 March 2011
Telo de Mascarenhas Obituary 1979
Já não é dos vivos o Dr. Telo de Mascarenhas
A sua figura imponente de lutador sem treguas, para alguns dos seus amigos era figura controvertida, mas ninguem foi capaz de por em duvida o seu indefectível nacionalismo, o seu amor à Pátria que mereceu o reconhecimento do Governo da Índia que o galardoou com Padma Shree, como combatente de liberdade.
A sua folha de serviço como combatente de liberdade foi multiflora. Na All-India Rádio, de Nova-Deli, e na Imprensa a sua acção se desdobrou de uma forma admirável. No Ressurge Goa, primeiro publicado em Bombaim, e depois da reintegração deste território na Índia dos seus sonhos, em Pangim, onde a sua pena cintilante versou assuntos, palpitantes de interesses da sua terra natal e na Coluna de Pilatos vergastou sem dó nem piedade muita hipocrisia e desmando do Governo local.
Acérrimo imimigo do Governo da ditadura Salazarista, contava amigos dedicados entre portugueses e, ultimamente, o seu decidido empenho foi ver convertido em realidade o seu sonho de um “Círculo de Amizade Indo-Portuguesa” que tinha sido a preoccupação dos últimos anos.
Ainda, recentemente enviara para O Heraldo a reportagem a uma representação levada ao palco na Kala Academi e à qual assitira o embaixador designado da Índia junto do Governo de Portugal, sr. Auduta Cacodcar, reportagem que daremos na edição de amanhã como a sua última contribuição e preito da nossa enternecida saudade.
Fulminado por um súbito colapso cardíaco nas primeiras horas da manhã de anteontem rendeu a sua alma ao Criador, nas suas casa de Camorlim, este nosso prezado amigo e colaborador, que contava setenta e oito anos de idade.
Poeta, escritor e jornalista, tem à seu crédito várias publicações e colaborou assiduamente na imprensa, tanto local bem como na estrangeira.
Combatente de Liberdade, agraciado com a comenda de Padma Shri em 1976, fundador do Ressurge Goa, cujo tema oi sempre batalhar contra a ditadura de Salazar, de quem, por ironia de destino, fora seu aluno predelicto, Dr. Telo de Mascarenhas, quando regressou ao seu torrão natal ao 9 de Agosto de 1970, foi recebido com as máximas honras, em geral, dispensadas a um herói e fundou logo o “Círculo de Amizade Indo-Portuguesa” do qual tornou-se o seu primeiro presidente.
Depondo um punhado de goivos sobre a sua campa fria erguemos uma prece fervente pela sua alma e enviamos as nossas sentidas condolências a sua viúva, sra D. Elsa Mendonça e Mascarenhas e demais família.
A sua figura imponente de lutador sem treguas, para alguns dos seus amigos era figura controvertida, mas ninguem foi capaz de por em duvida o seu indefectível nacionalismo, o seu amor à Pátria que mereceu o reconhecimento do Governo da Índia que o galardoou com Padma Shree, como combatente de liberdade.
A sua folha de serviço como combatente de liberdade foi multiflora. Na All-India Rádio, de Nova-Deli, e na Imprensa a sua acção se desdobrou de uma forma admirável. No Ressurge Goa, primeiro publicado em Bombaim, e depois da reintegração deste território na Índia dos seus sonhos, em Pangim, onde a sua pena cintilante versou assuntos, palpitantes de interesses da sua terra natal e na Coluna de Pilatos vergastou sem dó nem piedade muita hipocrisia e desmando do Governo local.
Acérrimo imimigo do Governo da ditadura Salazarista, contava amigos dedicados entre portugueses e, ultimamente, o seu decidido empenho foi ver convertido em realidade o seu sonho de um “Círculo de Amizade Indo-Portuguesa” que tinha sido a preoccupação dos últimos anos.
Ainda, recentemente enviara para O Heraldo a reportagem a uma representação levada ao palco na Kala Academi e à qual assitira o embaixador designado da Índia junto do Governo de Portugal, sr. Auduta Cacodcar, reportagem que daremos na edição de amanhã como a sua última contribuição e preito da nossa enternecida saudade.
Fulminado por um súbito colapso cardíaco nas primeiras horas da manhã de anteontem rendeu a sua alma ao Criador, nas suas casa de Camorlim, este nosso prezado amigo e colaborador, que contava setenta e oito anos de idade.
Poeta, escritor e jornalista, tem à seu crédito várias publicações e colaborou assiduamente na imprensa, tanto local bem como na estrangeira.
Combatente de Liberdade, agraciado com a comenda de Padma Shri em 1976, fundador do Ressurge Goa, cujo tema oi sempre batalhar contra a ditadura de Salazar, de quem, por ironia de destino, fora seu aluno predelicto, Dr. Telo de Mascarenhas, quando regressou ao seu torrão natal ao 9 de Agosto de 1970, foi recebido com as máximas honras, em geral, dispensadas a um herói e fundou logo o “Círculo de Amizade Indo-Portuguesa” do qual tornou-se o seu primeiro presidente.
Depondo um punhado de goivos sobre a sua campa fria erguemos uma prece fervente pela sua alma e enviamos as nossas sentidas condolências a sua viúva, sra D. Elsa Mendonça e Mascarenhas e demais família.
Friday, 4 March 2011
Manuel Ferreira - O apoio de que necessitam os literatos (1954)
Já há tempos, ao de cima da rama, nos referimos ao assunto e hoje apetece-nos, uma outra vez, bordejar o siso, um nadinha só mais amplamente, porque, estamos na nossa, de que o assunto merece os esmeros e os mimos paternais de quem cuida e manda. De quem cuida e de quem manda e, mais que tudo, responde pela manutenção dos valores intelectuais. Afinal, aqueles valores que perduram e se perpetuam nos caminhos ásperos e heróicos do Tempo e do Espaço.
Seja esta a primeira pergunta, se me dão licença. Há ou não há valores goeses actuais? Há ou não há valores goeses em nossos dias, uns entrados na idade e amadurecidos pelo estudo e ainda não minados pela desilusão, outros tenros de anos, irrompendo para a vida com o entusiasmo remoçado de quem se sente talhado pelos fados para as coisas da Literatura?
Cremos que sim, pelo menos em maior ou menor grau.
Deixemos os mais velhos que pelos anos fora têm rompido a vencer dificuldades de toda a espécie, e falemos hoje de novos. Entre estes há, pelo menos, jovens poetas, já que a poesia é a forma artística mais pronunciada nas primeiras idades literárias, porque em seus inícios ela é toda lírica, emoção pura e primitiva, e nada, ou pouquíssimo, racional, intelectualizada.
E aqui temos de lançar uma outra pergunta. E onde encontram esses jovens poetas, na floração do seu talento, os estímulos para continuarem os seus exercisios literários estímulos para continuarem os seus exercísios literários, para darem volume definido e humano aos seus sonhos poéticos, às suas ambições de homens que vêem na Arte a sua audaciosa e mais querida razão de ser? Melhor, talvez: como poderão esses nóveis literatos vazar os seus versos ou os seus ensaios literários? Como poderão comunicar eles com o público, se não alcançam nada através de que? E não nos esqueçamos de que a comunicação com o público, que é lograda especialmente através de publicações e da critica, é dos factos mais decisivos para a evolução do artista. Já porque o artista encontra nesse como que diálogo entre si e a massa o remate de tarefa realizada e cumprida ainda que momentaneamente.
Eis porque ousamos avantar aquilo que uma vez sugerimos: criarem-se as possibilidades de algum organismo lançar mãos dos originais dos poetas (ou de contistas ou romancistas, se eles vierem a sugir em Goa) e dá-los a conhecer ao público, por intermédio de publicações gratuitas ou compradas aos autores.
A Imprensa Nacional, parece-nos, não encontraria dificuldades que não fossem ultrapassáveis, para levar adiante iniciativa tão generosa e útil, se os poderes constituintes assim o entendessem e o determinassem.
E se a tudo isto, ajuntássemos antologias de prosadores e poetas goeses que ergueram alto o seu nome através dos anos e edições de valores actuais bem definidos, prestava-se um belo serviço à Cultura Portuguesa e satisfazia-se assim uma necessidade que, de uma assentada aprazia a autores, ao público e a todos quantos têm para si que uma coisa nunca poderá ser destruída e sempre fica como padrão perpétuo e reduto indestrutível: a Cultura.
Evidente mente que esta sugestão despretensiosa, mas sincera, para se tornar numa realidade invejável requeria uma pequena secção que poderia ficar adstrita à Imprensa Nacional e com latitude suficientemente elástica de modo a que pontos de vista menos largos ou menos convenientes não viessem apear os vôoes poéticos ou os rasgos humanos dos prosadores com direito de mérito a serem publicados.
Este facto o reputamos de muita importância e antolha-se-nos que para se levar que para se levar adiante a obra que referimos é absolutamente necessário tê-lo bem presente e bem vivo na memória, senão tudo ficará sujeito a proporções de obra maninha.
Seja esta a primeira pergunta, se me dão licença. Há ou não há valores goeses actuais? Há ou não há valores goeses em nossos dias, uns entrados na idade e amadurecidos pelo estudo e ainda não minados pela desilusão, outros tenros de anos, irrompendo para a vida com o entusiasmo remoçado de quem se sente talhado pelos fados para as coisas da Literatura?
Cremos que sim, pelo menos em maior ou menor grau.
Deixemos os mais velhos que pelos anos fora têm rompido a vencer dificuldades de toda a espécie, e falemos hoje de novos. Entre estes há, pelo menos, jovens poetas, já que a poesia é a forma artística mais pronunciada nas primeiras idades literárias, porque em seus inícios ela é toda lírica, emoção pura e primitiva, e nada, ou pouquíssimo, racional, intelectualizada.
E aqui temos de lançar uma outra pergunta. E onde encontram esses jovens poetas, na floração do seu talento, os estímulos para continuarem os seus exercisios literários estímulos para continuarem os seus exercísios literários, para darem volume definido e humano aos seus sonhos poéticos, às suas ambições de homens que vêem na Arte a sua audaciosa e mais querida razão de ser? Melhor, talvez: como poderão esses nóveis literatos vazar os seus versos ou os seus ensaios literários? Como poderão comunicar eles com o público, se não alcançam nada através de que? E não nos esqueçamos de que a comunicação com o público, que é lograda especialmente através de publicações e da critica, é dos factos mais decisivos para a evolução do artista. Já porque o artista encontra nesse como que diálogo entre si e a massa o remate de tarefa realizada e cumprida ainda que momentaneamente.
Eis porque ousamos avantar aquilo que uma vez sugerimos: criarem-se as possibilidades de algum organismo lançar mãos dos originais dos poetas (ou de contistas ou romancistas, se eles vierem a sugir em Goa) e dá-los a conhecer ao público, por intermédio de publicações gratuitas ou compradas aos autores.
A Imprensa Nacional, parece-nos, não encontraria dificuldades que não fossem ultrapassáveis, para levar adiante iniciativa tão generosa e útil, se os poderes constituintes assim o entendessem e o determinassem.
E se a tudo isto, ajuntássemos antologias de prosadores e poetas goeses que ergueram alto o seu nome através dos anos e edições de valores actuais bem definidos, prestava-se um belo serviço à Cultura Portuguesa e satisfazia-se assim uma necessidade que, de uma assentada aprazia a autores, ao público e a todos quantos têm para si que uma coisa nunca poderá ser destruída e sempre fica como padrão perpétuo e reduto indestrutível: a Cultura.
Evidente mente que esta sugestão despretensiosa, mas sincera, para se tornar numa realidade invejável requeria uma pequena secção que poderia ficar adstrita à Imprensa Nacional e com latitude suficientemente elástica de modo a que pontos de vista menos largos ou menos convenientes não viessem apear os vôoes poéticos ou os rasgos humanos dos prosadores com direito de mérito a serem publicados.
Este facto o reputamos de muita importância e antolha-se-nos que para se levar que para se levar adiante a obra que referimos é absolutamente necessário tê-lo bem presente e bem vivo na memória, senão tudo ficará sujeito a proporções de obra maninha.
Thursday, 3 March 2011
Frei Manuel Cristo - As Letras em Goa (1954)
Faz poucos meses, um escritor metropolitano que viveu algum tempo nesta terra e se interessou com vivo carinho pela actividade cultural do nosso pais, registava em tom magoado, que Goa, sem embargo de ser reputada como centro de cultura lusíada no Oriente, contribuísse com escassa produção, no campo literário.
Por nossa vez, não hesitamos em subscrever o amargo reparo contanto que se limite somente ao presente. De feito, mercê de factores que longo e também delicado se esmiuçar neste lugar, as Letras em Goa vegetam presentemente numa estagnação.
Talvez a um espírito superficial se afigure esta opinião pouco exacta à vista de abundância de periódicos que entre nós pululum. É certo que aumentou, nos nossos dias, o número de jornais; mas doutro lado não se pode deixar de admitir que cresceu concomitantemente a onde de desmazelo com que é tratada a língua na qual estas folhas vêm a lume.
Consola, todavia, verificar que nem sempre o goês, integrado na cultura portuguesa, fez pouco do idioma.
De posse duma sólida formação humanística e lidando com quase toda a literatura portuguesa e sobretudo com a clássica, os nossos escritores de antanho manejavam a língua de Vieira com tal domínio, apesar de não a terem aprendido desde a infância, que causavam espanto nos próprios meios cultos da metrópole.
Dr. Júlio Gonçalves, insigne professor e escritor do século passado, se lê que usava com tal pureza a língua que em Portugal era tido por esse facto como um reinol e não como um puro goês.
Oferecemos, nesta página, trechos escolhidos de dois dos nossos escritores que ganharam loiros, no manejo do idioma português. São eles Floriano Barreto e Wolfango da Silva.
O primeiro anti-sazão arrebatado pela Morte ao cultivo das boas letras distinguiu-se como filho dilecto das musas e como tal deixou uma coletânea de vários poemas intitulada Falenos e de que extraímos a poesia que vai publicada em outro lugar.
O outro escritor é e Dr. F.X. Wolfango da Silva, personalidade multifacetada em que sobrepujava talvez o seu peregrino talento literário. Chefe dos Serviços de Saúde, mestre cujos lições sobre medicina eram escutadas com acatamento e admiração pelas gerações de estudantes que frequentaram a nossa Escola Médica, orador da palavra enfeitiçante graças à qual os temas da ciência se despojavam da natural aridez e ganhavam vida e interesse, o Dr. Wolfango da Silva possuía o raro condão de imprimir a beleza a qualquer produção que saísse do seu privilegiado espírito.
Por nossa vez, não hesitamos em subscrever o amargo reparo contanto que se limite somente ao presente. De feito, mercê de factores que longo e também delicado se esmiuçar neste lugar, as Letras em Goa vegetam presentemente numa estagnação.
Talvez a um espírito superficial se afigure esta opinião pouco exacta à vista de abundância de periódicos que entre nós pululum. É certo que aumentou, nos nossos dias, o número de jornais; mas doutro lado não se pode deixar de admitir que cresceu concomitantemente a onde de desmazelo com que é tratada a língua na qual estas folhas vêm a lume.
Consola, todavia, verificar que nem sempre o goês, integrado na cultura portuguesa, fez pouco do idioma.
De posse duma sólida formação humanística e lidando com quase toda a literatura portuguesa e sobretudo com a clássica, os nossos escritores de antanho manejavam a língua de Vieira com tal domínio, apesar de não a terem aprendido desde a infância, que causavam espanto nos próprios meios cultos da metrópole.
Dr. Júlio Gonçalves, insigne professor e escritor do século passado, se lê que usava com tal pureza a língua que em Portugal era tido por esse facto como um reinol e não como um puro goês.
Oferecemos, nesta página, trechos escolhidos de dois dos nossos escritores que ganharam loiros, no manejo do idioma português. São eles Floriano Barreto e Wolfango da Silva.
O primeiro anti-sazão arrebatado pela Morte ao cultivo das boas letras distinguiu-se como filho dilecto das musas e como tal deixou uma coletânea de vários poemas intitulada Falenos e de que extraímos a poesia que vai publicada em outro lugar.
O outro escritor é e Dr. F.X. Wolfango da Silva, personalidade multifacetada em que sobrepujava talvez o seu peregrino talento literário. Chefe dos Serviços de Saúde, mestre cujos lições sobre medicina eram escutadas com acatamento e admiração pelas gerações de estudantes que frequentaram a nossa Escola Médica, orador da palavra enfeitiçante graças à qual os temas da ciência se despojavam da natural aridez e ganhavam vida e interesse, o Dr. Wolfango da Silva possuía o raro condão de imprimir a beleza a qualquer produção que saísse do seu privilegiado espírito.
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