Friday 17 June 2011

Carmo Azavedo - O langotim contra as calças: uma luta de classes (1975)


Quando, por fins de 1963, se constitui uma frente anti-integracionista pela amalgação de cinco partidos, todos chefiados por cristãos, soba  denominação de “Goeses Unidos”, tendo-se formado, da outra banda, idêntica frente, por idênticos processos, a Maharastravadi Gomantaka Sangathana, liderada por um hindu, alegou-se, e não sem alguma razão, posto que as duas frentes ou, se quiseram, organizações partidárias unificadas, fossem não exclusiva, mas predominantemente constituídas de membros de uma só comunidade, que os dois agrupamentos rivais eram essencialmente comunalistas.

Mas tarde, quando na primeira Assembleia Legislativa, se verificou uma cisão nas fileiras dos Goeses Unidos, formando-se dois grupos dentro do partido, o Grupo Sequeira e o Grupo Furtado (ou melhor, Loyola Furtado), não pôde deixar de se dizer, e de igual modo não sem alguma razão, embora a clivagem não tivesse seguido inteiramente a linha da casta, que a comunidade cristã de Goa voltara a ter dois partidos ou grupos castistas, como no passado, com  o Partido Ultramarino, centrado à volta de “O Ultramar” e o Partido Indiano, tendo por centro “A Índia Portuguesa”, aquele sob a chefia dos Costas e este dos Loyolas.

Felizmente, quando se deu, na segunda Assembleia, novo desdobramento, sob a liderança do sr. Orlando Sequeira Lobo, este preferiu apelidar de “progressivo” o seu grupo a baptizá-lo com o seu próprio nome e não chegou a formalizar-se a separação a ponto dos dois grupos disputarem as eleições imediatas como agrupamentos rivais, não só com programas políticos, mas também com símbolos diversos, como da vez primeira.

Melhor ainda, desta feita, como a apagar, de uma vez para sempre, o estigma do comunalismo, no partido anti-integracionista, temos dois grupos, devidamente reconhecidos, sim, com símbolos diferentes e de novo levando o nome do respectivo chefe, o Grupo Naique e o Grupo Sequeira, opondo as próprias denominações dos grupos rivais um categórico desmentido ao carácter supostamente comunalista do partido anti-integracionista.

Mas – ocorre perguntar – vai agora o comunalismo ou o castismo ceder o lugar à luta de classes? É o que, pelo menos, parece deixar ver o que se passou na recente eleição para o Conselho Municipal de Pangim pelo círculo de Ribandar, em que a disputa não foi entre os dois partidos rivais, os G.U. e a M.G., mas, por estranho que pareça, entre os dois grupos de primeiro partido, o Grupo Naique e o Grupo Sequeira, uma disputa frontal, um duelo, em que não houve terceiros, nem de outros partidos quaisquer, nem independentes.

Dizem-me – diss-me, entre outras, pessoa da maior respeitabilidade, antigo partidário de lealdade a toda prova ao sr. Jack de Sequeira, ora totalmente disiludido com a sua egocêntrica liderança – que o slogan na eleição de Ribandar não foi, como seria de esperar, “Sequeira” contra “Naique” ou “Duas Folhas” (o símbolo dos anti-integracionistas no Opinion Poll) conta “Mão””, mas – imaginam o que? – “Langotim contra Calças” (Kastti versus Pants), representando um dos candidatos, o sr. Emerciano Pereira do grupo Sequeira, os pescadores de langotim e o outro, o sr Luís Valentino de Sousa do grupo Naique, a pequena ou media burguesia de calças.

Esta luta de classes não terá, eu bem sei, o significado marxista da expressão, com todas as suas implicações sociais, económicas e politicas, tais como as vemos teorizadas na famosa obra Das Kapital de Kar Marx; nem o sr. dr. Jack de Sequeira, que eu saiba, teria virado comunista, depois de não só ver desfeito o seu sonho doirado de ser ministro-chefe, à testa de um Governo dos Goeses Unidos, mas até perdido o título de Chefe de Oposição no órgão legislativo pela separação dos legisladores do Grupo Naique.

A luta de classes, que traduz o slogan “Langotim contra Calças”, não tem, como acabei dizer, o significado e o alcance que tem no vocabulário marxista. Mas não deixa de ser uma luta na mesma, luta do langotim, dos “langotinados”, se me é lícito cunhar esta neologismo a modo dos “descamisados” de Evita Peron, a plebe, empregado o vocábulo sem sentido pejorativo ou ofensivo, contra as calças, a burguesia white-collard, de colarinho e gravata ou, melhor, de acordo com os tempos de bush-coat ou balalaica – em uma palavra, uma luta das massas contra as classes – masses against the classes.  

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